sexta-feira, janeiro 20, 2006

Iniciação X Auto-Iniciação

Política, meu caro... Somente isso.

Para refletir, sou sugerir um exemplo histórico:

No fim do século II EC, os cristãos eram perseguidos pelo Estado Romano devido a sua posição ideológica de não cultuar o Imperador. Menos de 50 anos depois, os cristãos - durante o governo de Constantino - queimaram mais de 60 livros considerados não-canônicos, isto é apócrifos.

"E dai?" - devem estar perguntando todos de athame, foice, tocha e forcado nas mãos...

Bem, um meio seguro de destruir outro sistema ideológico (seja ele de natureza política, religiosa ou filosófica) é tornando proibidos o acesso as suas referencias. No caso dos cristãos, queimar esses evangelhos contribuiu para o fim do gnosticísmo que era (para definir bem grosso modo) um curioso sincretismo de cristianismo e culto de mistério com raízes egípcias e helênicas.

No nosso caso, a boa e velha discussão "iniciação x auto-iniciação" serve para deslegitimar as tradições religiosas que não acreditam nisso, i.e., aquelas que acreditam em iniciação formal contra àquelas que não acreditam. Aqui a forma de "acabar com as referencias" assume um tom mais retórico e menos embasado de ambos os lados.

Para os iniciados formais, sempre fica a dúvida posta pelo Malhado tópicos atrás, com a questão da linhagem como um grande golpe de marketing, mas nem por isso ilegítimo; para os auto-iniciados serve o adágio de minha iniciadora: "o sucesso será sua prova".

Quem possui a verdade, detém o poder. Mas não se enganem: verdades são construídas historicamente. Para alguns de vocês, a bíblia sempre teve quatro evangelhos e não mais de 60; mas entretanto, não foi essa história que nos contaram. Assim, quando eu vejo essa discussão de "iniciação x auto-iniciação", lanço o meu olhar de historiador ao futuro e pergunto: "quais são os interesses políticos e institucionais por de trás dessa celeuma?”.

Poder, meus caros. Apenas isso... Pensem por um instante como seria o mundo se apenas um de vocês pudesse decidir quem é ou não wiccaniano ou druida ou satanista ou [insira-aqui-sua-crença-favorita]...

E é isso que determinados grupos querem, defender seus pontos de vista em detrimento de determinada perspectiva, esquecendo que a Deusa ama a diversidade. Para a nossa religião, todas as duas formas de iniciação são necessárias. Para usar uma metáfora biológica, ambas as formas de iniciação são mecanismos de adaptação dessa religião a contextos sociais diversos. (ta, eu sei que modelos biológicos aplicados à sociologia estão fora de moda desde a Segunda Guerra). Na medida em que iniciações formais garantem a manutenção de uma determinada tradição, elas limitam o acesso à mesma (afinal, não conhecemos muitos gardnerianos...). Todavia, a prática solitária e eclética não dispõe de diversas vantagens (egrégora mágica, apoio de grupo, conhecimento sistematizado, etc.) que um Coven tradicional pode ter. Portanto, eu procuro pensar que tipo de condições sociais permitem essa ou aquela forma religiosa.

Bem, nosso tempo já demonstrou com clareza que tipo de wicca nos temos. E sabemos com alguma precisão que tipo de bruxaria tivemos no passado, seja este passado próximo ou distante. A transmissão da linhagem através da família desmonstrou ser a forma mais efetiva de proteger o culto aos Antigos.


Todavia, hoje a Deusa tenha outras formas de proteger seu culto e isso inclui com toda a certeza mídia de massa e auto-iniciações. Aqueles que alcançarem o sacerdócio realmente terão passado por inúmeros testes sutis, confirmando o dito o "sucesso será sua prova". E é por essas que eu não me preocupo e nem posso me preocupar com a qualidade deste ou daquele iniciado.


Outro dia, eu estive pensando numa imagem muito sugestiva: somos (como iniciados) instrumentos da Deusa. Então imaginei uma mulher numa cabana com seu altar e muitas estantes. Em cada canto dessa cabana há um instrumento: um athame, um bastão, um livro, a própria mesa de cada altar... E me veio à cabeça ela propria nomeando cada instrumento, chamando este athame de iniciado fulano, aquele bastão de sacerdote beltrano. Me ocorre agora qua cada mesa de altar é um coven, uma tradição... E que as vezes ela coloca alguns instrumentos juntos porque ELA QUER AQUELE ALTAR DAQUELE JEITO!

E do mesmo modo que nos temos alguns instrumentos que não ficam em nosso altar - por ex.: aquele vaso de planta dedicado às fadas do inverno ou um athame específico, usado para guardar a entrada da casa, existem bruxas/os - instrumentos Dela - que também trabalham sozinhos. Alguns "instrumentos" foram Consagrados segundo regras específicas (Lua num determinado signo, regras de uma tradição, etc.) e outros foram produto de pura intuição. Intrumentos tem sempre um nome, seja teu Cálice de Bruxo, seja o sacerdote "Zezinho"; e quando ela decide mudar o(s) altar(es), Ela pode rearranjar tudo segundo Sua vontade. Assim, como para cada instrumento nosso, cada instrumento Dela. E é por isso que eu não me preocupo com essa celeuma tola sobre iniciação X auto-iniciação.

1 Comments:

Blogger Aileen Daw said...

Adorei a comparação do altar... mto boa mesmo!!!
=)
Bjo Rayan! Saudades!

02:06  

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