domingo, janeiro 29, 2006

"....Acho que você é um Viking..."

"Se o garçom ou copeiro no bar vive perguntando a você, "O que é hidromel? ", acho que você é um Viking.

Se você mede a potência do seu carro novo em Auroques-força
(espécie de bovino selvagem extinto, nativo de terras nordicas)
em vez de cavalos força, acho que você é um Viking.

Se um sujeito estranho, de cara enorme e vermelha aparecer para o almoço
e comer você, todos os mantimentos de sua casa, SUA casa e arredores,
acho que você é um Viking.

Se você considera cerveja e bacalhau uma refeição de gourmet, acho que você é um Viking.

Se você pensa que um Luterano
é nada mais do que uma fonte rapida de dinheiro, acho que você é um Viking.

Se sua nova namorada desmaiou ao descobrir que
você deu um nome pessoal e diferente para CADA uma de suas facas de cozinha,
acho que você é um Viking.

Se você pensa que atacar e pilhar pequenas cidades
é um bom jeito de conhecer pessoas, acho que você é um Viking.

Se, após recitar a sua linhagem familiar e historia,
você descobrir que todos os seus amigos sairam a duas horas atraz, acho que você é um Viking.

Se você pensa que Helga, Gertrud and Snotra
são realmente nomes muito bonitinhos para garotas,
acho que você é um Viking.

Se a melhor coisa que você pode dizer da França é que você deixou a maior parte dela
ainda de pé, acho que você é um Viking.

Se você mudou seu nome de Jose Schmit para Hralfnkel Niflgrimsson, você é provavelmente um Viking.

Se pirataria nas costas maritimas da Florida nestes dias modernos
te soa como uma boa oportunidade de carreira...

Se você pensa que Nordico Clássico é uma lingua
facil de aprender, atrativa e amiga-do-usuario, acho que você é um Viking.

Se sua ideia de temperos fortes é sal e pimenta, acho que você é um Viking.

Se você fica balançando uma lança sobre o time de basquete ou de futebol visitante
e oferece suas almas para Odinn, acho que você é um Viking.

Se você pensa que uma viagem para Iowa ou o Xingú é uma aventura exotica,
acho que você é um Viking muito bravo e corajoso.

Se você termina suas ferias na Europa com mais dinheiro do que você partiu,
acho que você pode ser muito bem um Viking.

Se um cara muuuito estranho, maneta de uma mão só,
aparecer na sua casa, beber toda sua cerveja,
pronunciar sentenças e discursos para sua vizinhança fundamentalista,
apontar todos os pontos inexatos de acordo com a lei
do ultimo lançamento do disco de Blues do
"NYPD Blues" (New York Police Department)
e deixar amarrado um lobo ENOOOOORME no seu novo Ford Mustang, acho que você é um Viking.

http://www.angelfire.com/wy/wyrd/viking2.html

domingo, janeiro 22, 2006

Uma Coleção de Varias Piadas Pagãs Sobre Lampadas

Quantos Gardnerianos são necessários para trocar uma lampada?1) Desculpe, este é um segredo do 30° Grau. 2) (Em um tom alto e agourento) "Porque você quer saber... iniciado?"

Quantos Wiccans Tradicionais Britanicos são necessários para mudar uma lampada? 13. Um para trocar a lampada, e 12 para lamentar a passagem da lampada velha.

Quantos Thelemitas são necessários para mudar uma lampada? 1) 93. 2) Nenhum - Thelemitas se dão tão bem no escuro como no claro. 3) Nenhum - real Thelemitas não tem medo do escuro. Fite-os e espere que eles falem o obvio)

Quantas Bruxas de Frias "Escolas de Wicca" são necessárias para mudar uma lampada? "Só para você! É isso mesmo, VOCÊ! E por apenas $195, nós lhe mandaremos o nosso"Curso do Poder Magico das Bruxas de mudar a lampada" completo com conhecimento real que você possa aplicar em QUALQUER lampada em QUALQUER LUGAR! Escutem o testemunho de um jovem casal de Wisconsin que..."

Quantos membros da IOT são necessários para mudar uma lampada? Sinto muito, este ritual tem direitos autorais.
Quantos Proteans são necessários para mudar uma lampada? Eu não posso contar a você-- nós nunca trocamos uma lampada da mesma maneira duas vezes! :}

Quantos druidas ADF são necessários para mudar uma lampada? Seis. Um para trocar a lampada, um para escrever uma musica sobre quão melhor foia lampada velha, e quatro para escrever parodias conflitantes sobre a musica do segundo Druida.

Quantos Shamans são necessários para mudar uma lampada? Nenhum. É só eles se transformarem em um gato ou morcego que eles poderão ver no escuro.

Quantos tantricos são necessários para mudar uma lampada? 2, enquanto a lampada permanecer na cama...

Quantos Magistas Cerimoniais são necessários para mudar uma lampada? 1) Um. Eles a seguram, e o mundo gira em torno deles. (Eu conheço um destes; é verdade! 2) Só um, mas ele tera que fazer isto na 3° Sexta feira de um mes quando a Lua estiver em Touro e for a decima - quinta hora planetaria... e isso *não* tem graça

Quantos Druidas são necessários para mudar uma lampada? 501. Um para trocar a lampada e 500 para alinhar o novo rochedo.

Quantas Familias traditionalistas são necessárias para mudar uma lampada? Luz de velas foi boa o suficiente para nossos ancestrais, é boa o suficiente para nós!

Quantos Astrologos são necessários para mudar uma lampada? "Não pergunte para mim agora, Mercurio esta retrogado!"

Quantos Pagãos são necessários para mudar uma lampada? Seis. Um para troca-la, e 5 para sentar em volta se lamentando que lampadas nunca queimaram antes desses Cristãos virem para ca.
Quantas Bruxas são necessárias para mudar uma lampada? Em o que?

Quantos Asatruars são necessários para mudar uma lampada?R1: Nove - um para segurar a lampada, e oito para beber ate que a sala comece a girar...(Obrigado a Ann Sheffield)R2: Nenhum - Ha luz suficiente dos moneysterios se incendiando...(Obrigado a Krei)R3: Nenhum - As luzes das igrejas se queimando iluminam o suficience...(Obrigado a Bjorñ)

Quantos macumbeiros da Antiga Religião Africana são necessários para mudar uma lampada?Dois - Um babalorisha (Sacerdote - Pai de Santo) para gritar que a lampada esta queimada e o Yawô (Noviço) para trocar... (Obrigado a Sandra Ruy Oyakilewasy)

Quantos Theosofístas são necessários para mudar uma lampada?A: Nenhum. Quando eles terminarem de discutir se a lampada necessita ser mudada, o metodo próprio em que a lampada sera trocada, como issotem sido feito historicamente, e como as outras pessoas trocam as lampadas, ja sera luz do dia. (Agradecimentos para o BL) B: Nenhum. Isto foi o carma da lampada (e talvez do bulbo) de se queimar. No tempo certo ela se substituira sozinha, talvez com um bulbo de mais alta mas nunca com uma voltagem mais baixa.

Quantos maçons, e especialmente quanto tempo eles levam para mudar uma lampada?R1: Não sei dizer... Eles ainda usam luz de velas!R2: Nove. Um para fazer o trabalho, e os outros para fazer comentarios- Sendo que um dos nove é a secretaria fazendo minutas sobre isso...R1 e R2 - Agradecimentos ao Dutch Ross .'.R3: Sinto muito caro Aprendiz, este é um segredo do Terceiro Grau... - R3 por MedhalR4: Após muita pesquisa sobre esta questão complicada, esta agora pode ser respondida.É preciso 20 maçons, como é explicado a seguir:
2 para se queixar que a luz não funciona1 para passar o problema para qualquer um dos outros comites, a Junta Administrativa do Templo ou o Mestre de Loja.3 para estudar sobre a luz na Loja.2 para investigar como os Cavaleiros de Colombo resolvem a situação.3 para discutir sobre isso.5 para planejar um almoço beneficente para levantar fundos para a lampada nova.2 para se queixar que "não é o jeito que nós faziamos isso antigamente."1 para pegar emprestado uma escada, doar a lampada e instala-la.1 para encomendar uma placa memorial em honra da lampada velha, e fazer as inscrições nela.

Signos do Zodiaco

Quantos Arietinos são necessários para mudar uma lampada? Um somente, mas será necessario uma boa porção de lampadas.

Quantos Taurinos são necessários para mudar uma lampada? O que, eu me mover?

Quantos Geminianoss são necessários para mudar uma lampada? II

Quantos Cancerianoss são necessários para mudar uma lampada? Somente um, mas ele tera que trazer sua mãe.

Quantos Leoninos são necessários para mudar uma lampada? Uma Duzia. Um para trocar a lampada, e onze para aplaudir.

Quantos Virginianoss são necessários para mudar uma lampada? Cinco. Um para limpar o soquete, um para espanar a lampada, um para instalar, e dois engenheiros para checar o trabalho.

Quantos Librianos são necessários para mudar uma lampada? Librianos não conseguem decidir se a lampada precisa ser trocada.

Quantos Escorpinianos são necessários para mudar uma lampada?Nenhum. Eles GOSTAM do escuro.

Quantos Sagitarianos são necessários para mudar uma lampada?Um para instalar a lampada, e um Virginiano para catar os pedaços.

Quantos Capricornianoss são necessários para mudar uma lampada?A luz esta boa como ela é.

Quantos Aquarianos são necessários para mudar uma lampada?Você ja perguntou a lampada se ela QUER ser mudada?

Quantos Piscianos são necessários para mudar uma lampada?Que lampada?

sexta-feira, janeiro 20, 2006

Iniciação X Auto-Iniciação

Política, meu caro... Somente isso.

Para refletir, sou sugerir um exemplo histórico:

No fim do século II EC, os cristãos eram perseguidos pelo Estado Romano devido a sua posição ideológica de não cultuar o Imperador. Menos de 50 anos depois, os cristãos - durante o governo de Constantino - queimaram mais de 60 livros considerados não-canônicos, isto é apócrifos.

"E dai?" - devem estar perguntando todos de athame, foice, tocha e forcado nas mãos...

Bem, um meio seguro de destruir outro sistema ideológico (seja ele de natureza política, religiosa ou filosófica) é tornando proibidos o acesso as suas referencias. No caso dos cristãos, queimar esses evangelhos contribuiu para o fim do gnosticísmo que era (para definir bem grosso modo) um curioso sincretismo de cristianismo e culto de mistério com raízes egípcias e helênicas.

No nosso caso, a boa e velha discussão "iniciação x auto-iniciação" serve para deslegitimar as tradições religiosas que não acreditam nisso, i.e., aquelas que acreditam em iniciação formal contra àquelas que não acreditam. Aqui a forma de "acabar com as referencias" assume um tom mais retórico e menos embasado de ambos os lados.

Para os iniciados formais, sempre fica a dúvida posta pelo Malhado tópicos atrás, com a questão da linhagem como um grande golpe de marketing, mas nem por isso ilegítimo; para os auto-iniciados serve o adágio de minha iniciadora: "o sucesso será sua prova".

Quem possui a verdade, detém o poder. Mas não se enganem: verdades são construídas historicamente. Para alguns de vocês, a bíblia sempre teve quatro evangelhos e não mais de 60; mas entretanto, não foi essa história que nos contaram. Assim, quando eu vejo essa discussão de "iniciação x auto-iniciação", lanço o meu olhar de historiador ao futuro e pergunto: "quais são os interesses políticos e institucionais por de trás dessa celeuma?”.

Poder, meus caros. Apenas isso... Pensem por um instante como seria o mundo se apenas um de vocês pudesse decidir quem é ou não wiccaniano ou druida ou satanista ou [insira-aqui-sua-crença-favorita]...

E é isso que determinados grupos querem, defender seus pontos de vista em detrimento de determinada perspectiva, esquecendo que a Deusa ama a diversidade. Para a nossa religião, todas as duas formas de iniciação são necessárias. Para usar uma metáfora biológica, ambas as formas de iniciação são mecanismos de adaptação dessa religião a contextos sociais diversos. (ta, eu sei que modelos biológicos aplicados à sociologia estão fora de moda desde a Segunda Guerra). Na medida em que iniciações formais garantem a manutenção de uma determinada tradição, elas limitam o acesso à mesma (afinal, não conhecemos muitos gardnerianos...). Todavia, a prática solitária e eclética não dispõe de diversas vantagens (egrégora mágica, apoio de grupo, conhecimento sistematizado, etc.) que um Coven tradicional pode ter. Portanto, eu procuro pensar que tipo de condições sociais permitem essa ou aquela forma religiosa.

Bem, nosso tempo já demonstrou com clareza que tipo de wicca nos temos. E sabemos com alguma precisão que tipo de bruxaria tivemos no passado, seja este passado próximo ou distante. A transmissão da linhagem através da família desmonstrou ser a forma mais efetiva de proteger o culto aos Antigos.


Todavia, hoje a Deusa tenha outras formas de proteger seu culto e isso inclui com toda a certeza mídia de massa e auto-iniciações. Aqueles que alcançarem o sacerdócio realmente terão passado por inúmeros testes sutis, confirmando o dito o "sucesso será sua prova". E é por essas que eu não me preocupo e nem posso me preocupar com a qualidade deste ou daquele iniciado.


Outro dia, eu estive pensando numa imagem muito sugestiva: somos (como iniciados) instrumentos da Deusa. Então imaginei uma mulher numa cabana com seu altar e muitas estantes. Em cada canto dessa cabana há um instrumento: um athame, um bastão, um livro, a própria mesa de cada altar... E me veio à cabeça ela propria nomeando cada instrumento, chamando este athame de iniciado fulano, aquele bastão de sacerdote beltrano. Me ocorre agora qua cada mesa de altar é um coven, uma tradição... E que as vezes ela coloca alguns instrumentos juntos porque ELA QUER AQUELE ALTAR DAQUELE JEITO!

E do mesmo modo que nos temos alguns instrumentos que não ficam em nosso altar - por ex.: aquele vaso de planta dedicado às fadas do inverno ou um athame específico, usado para guardar a entrada da casa, existem bruxas/os - instrumentos Dela - que também trabalham sozinhos. Alguns "instrumentos" foram Consagrados segundo regras específicas (Lua num determinado signo, regras de uma tradição, etc.) e outros foram produto de pura intuição. Intrumentos tem sempre um nome, seja teu Cálice de Bruxo, seja o sacerdote "Zezinho"; e quando ela decide mudar o(s) altar(es), Ela pode rearranjar tudo segundo Sua vontade. Assim, como para cada instrumento nosso, cada instrumento Dela. E é por isso que eu não me preocupo com essa celeuma tola sobre iniciação X auto-iniciação.

quinta-feira, janeiro 19, 2006

Satanismo: realidades e acusações
Graham Harvey [
g.harvey@wkac.ac.uk ]
tradução por Leda Maria Perillo Seixas [
ledaps@bol.com.br ]

Definições sobre "religião" abundam. Todas são válidas, se ao menos servirem para desafiar e, a partir daí, refinar a compreensão. Tenho afirmado algumas vezes, parcialmente como brincadeira (mas apenas parcialmente), que é possível saber que algo é realmente uma religião quando: a) afirma oferecer soluções para problemas muito amplos, e b) provoca desacordo, divisão, e às vezes até mesmo violência entre seus próprios praticantes. Por tal critério, no mundo atual, o satanismo se tornou uma verdadeira religião. Há pessoas que realmente se denominam satanistas, e consideram possuir algo significativo para oferecer à humanidade. A evidência real do amadurecimento desta opção religiosa é que ela está agora internamente dividida, expressando dissensões: há rachaduras e conflitos sectários dentro das fileiras do satanismo.

Por outro lado, acusações feitas contra uma religião, freqüentemente acabam por não nos dizer nada sobre os acusados, e muito sobre os acusadores. As pessoas gostam de inventar e demonizar suas próprias alteridades. Realmente, a história humana está cheia de queixas feitas contra movimentos que nunca existiram, exceto em tais polêmicas.
Este artigo começa com a discussão sobre quem realmente são os satanistas e quem eles dizem ser. Isto é, o primeiro ponto é a auto-apresentação satânica e as diferenças que geram diversidades que indicam, a partir daí, aspectos importantes para os adeptos. A discussão apresenta os resultados de pesquisa sobre três "grupos" (entre vários tipos) de satanismo que são representativos das diversidades evidentes atualmente. Tem como base um projeto de pesquisa conduzido em 1995 na Grã Bretanha, seguido de uma atenção menos explícita desde então.

Em discussão posterior, notam-se acusações e temores entre os "observadores". Embora seja correto que a maior parte do que se diz e escreve sobre o satanismo seja inteira ou largamente um produto de fantasia e preconceito, há um par de boas razões para discuti-lo. Em primeiro lugar, aquilo que foi chamado "pânico satânico" (Richardson, Best and Bromley 1991) é instrutivo sobre as sociedades contemporâneas. Em segundo lugar, este é um contexto promissor para se considerar a "crise de legitimação" (Habermas 1975, Lyotard 1984), e questões mais amplas sobre como as pessoas conhecem ou afirmam conhecer. Oposição aos satanistas, ou melhor, às percepções do que eles devem ser, não é um fato surpreendente, dada a escolha da auto-denominação. Mas a discrepância entre o que os satanistas são e o que é dito sobre eles é produtiva e interessante. Minha intenção é, portanto, oferecer algumas informações sobre as alegações contemporâneas (dos satanistas e dos outros) sobre o satanismo, e fazer algumas sugestões sobre por que estas alegações poderiam ser interessantes para aqueles não engajados nessas práticas polêmicas. Assim, o artigo espera fazer mais do que oferecer fatos sobre uma religião e uma controvérsia religiosa. Ele pretende sugerir que existem boas razões acadêmicas para a consideração de grupos ainda muito pequenos e acusações muito extensas, e que acadêmicos de diversas disciplinas podem achar o satanismo interessante. Esta discussão está baseada no interesse da mídia. Eu realmente tenho sido um participante regular nas controvérsias, como entrevistado acadêmico, quase todas as vezes em que o satanismo aparece no noticiário de várias publicações e na mídia de radiodifusão.



Satanismo assumido

Existem realmente pessoas no mundo, que se denominam satanistas. Algumas pertencem a organizações de vários tamanhos, algumas não. Os satanistas possuem compreensões amplamente diferentes sobre o que o satanismo deveria ser, o que o satanismo deveria fazer para justificar sua auto-identidade, e também sobre quem eles acham que Satã é. Eles também variam em suas afirmações sobre as origens ou história antiga do satanismo. Isto certamente não surpreende, porque esta "história" é repleta (larga ou completamente) de queixas e acusações. Não me interesso por estes debates, a não ser quando eles fazem parte das identidades contemporâneas ou polêmicas sobre o satanismo. Desta forma, não ofereço visões sobre as origens do mal, nem digo nada decisivo sobre quando a "Missa Negra" deve ter sido rezada. De fato, interessa pouco para esta discussão se tais rituais são ficções literárias ou paródias carnavalescas, instrumentos de luta e poder político e religioso, ou hedonismo materializado em políticas identitárias, ou verdadeiros e genuínos atos de veneração a um mal putativo. Para o que nos interessa, duvido que alguém, antes do século XIX tenha aceito voluntariamente o rótulo de "satanista". Porém, uma vez que as pessoas começaram a usar este rótulo, deve ter sido para parecer mais interessantemente sinistras. Isto, entretanto, só poderia acontecer se fosse razoavelmente seguro – i.e., este fato é um produto e evidência de um grau de secularização. Entretanto, parece evidente que apenas poucos indivíduos denominaram-se satanistas até os idos de 1960. É para esta época que vou me voltar agora.

Fundações do satanismo

Anton LaVey fundou o satanismo ao formar a Igreja de Satã (IS) em 1960, na Califórnia, e ao escrever a Bíblia Satânica (1969) e outros livros semelhantes (ver La Vey 1972, 1992). Sem dúvida, La Vey atraiu crenças existentes e afirmações sobre Satã e o satanismo. Mas o satanismo de La Vey só pode ser confundido pelo descortino que veio a público, ou pela admissão da realidade de antigas fantasias e medos, por alguém que se recusou a ler o que La Vey escreveu, a escutar que ele falou, e a observar o que sua igreja fez. Quase tudo o que a IS tem em comum com o que as pessoas devem esperar que o satanismo seja, é a máscara sinistra que seu fundador e seus membros gostam de apresentar aos ingênuos. O satanismo realmente antisocial ou imoral não é mais substancial, tanto na IS quanto na performance de La Vey, que o diabo no filme O bebê de Rosemary. Certamente supõe-se que esta performance perturbe, talvez até ofenda pessoas – mas é apenas encenação. O satanismo de La Vey por trás da máscara e da mascarada é algo mais: é uma "religião do self".

Paul Heelas cunhou o termo "espiritualidade do self" para se referir ao movimento da Nova Era (Heelas 1996). Ele proveitosamente indica o que é central em várias espiritualidades contemporâneas: um projeto para descobrir, dar poder e legalizar nossa autêntica natureza (interior) freqüentemente contaminada pela socialização. Na linguagem da Nova Era: "você é Deus, você é Deus, você é Deus". E este "Deus" deve ser encontrado dentro do indivíduo, e seu potencial deve ser concretizado e expresso. Isto pode gerar a espiritualidade dos tipos místicos (ou mistificadores) separados do cotidiano, do comum e do mundano. Mas a Nova Era é freqüentemente mais parecida com outras religiões por ser inseparável de outros aspectos da vida. De fato, alguns críticos contestam a orientação para o sucesso de alguns New Agers. Realmente, a Nova Era manifesta-se tanto em estilo de negócios quanto na devoção a anjos e harmonia cósmica. Há uma lógica na noção de que pessoas que sabem que são Deus devem ser capazes de vender o que quer que queiram, e receber o que quer que desejem receber.

A IS de Anton La Vey é uma espiritualidade-própria torcida. Não é que o satanismo insista "Você é Satã, você é Satã, você é Satã", num tipo de inversão da Nova Era e do cristianismo. É, antes, que a tentativa de descoberta da verdadeira interioridade, é empreendida não através de pensamentos positivos e vida harmoniosa, e pela expressão da verdadeira divindade de alguém como sendo toda de "luz": o satanismo clama por uma rejeição mais radical da socialização. De acordo com La Vey, religiões representam poder sobre o povo, ganho quando as necessidades e desejos comuns são identificados com "pecado" ou "engano" e a "solução" (salvação ou iluminação) é oferecida ao obediente. Satã é o questionador deste sistema. Satã encoraja cada pessoa a experimentar e descobrir se elas acham que estes desejos e necessidades são úteis ou não.

Os escritos de La Vey e a revista da IS, The Black Flame, continuamente falam de Satã como se o nome se referisse a uma entidade real, que fala, age, planeja, deseja, inspira, é nomeada e convocada. Diz-se, por exemplo, que Satã se delicia quando os cristãos ouvem músicas sensuais, e os acusa de hipocrisia quando eles ao mesmo tempo abençoam tropas e rezam pela paz (La Vey 1969: 49). Entretanto, tal discurso de um Satã aparentemente pessoal tem por intenção reforçar ou dar poder ao "interesse racional no self" do indivíduo satanista. Ritual, mágica e estilo de vida são impulsionados por este "psicodrama". Satã é uma imagem útil para encorajar o individualismo no que este se refere à "oposição" e "não-conformidade". "A razão pela qual é chamado de satanismo é porque é divertido, preciso e produtivo" (La Vey 1992:10). Este não é um movimento baseado na revelação de uma divindade, mas uma religião própria que encoraja cada indivíduo a alcançar seu próprio potencial, e promove o "interesse racional no self".

De fato, foi um tanto impreciso falar acima sobre a "descoberta" da verdadeira interioridade: "o indivíduo não 'encontra' a si mesmo, o indivíduo cria a si mesmo" (La Vey 1992: 44). Com o objetivo de "criar a si mesmo", as pessoas são encorajadas a ceder honestamente a seus desejos no contexto de suas sociedades. A IS encoraja as pessoas a não serem abusivas (um sinal de imaturidade), mas serem elas mesmas socialmente – ainda que forte e eficazmente. A IS não oferece um sistema de iluminação ou uma técnica para experiência religiosa, mas encoraja a "indulgência e glorificação do carnal e material" (Gilmore 1993). O satanismo não é um "empenho em direção à divindade" (nem à do indivíduo, nem àquela de algum ser superior), mas uma aceitação e celebração da natureza humana física e animal (Nadramia 1993).

"Não se espera do satanismo que venere deidades diabólicas, mas que as manipule como símbolos com o objetivo de auto glorificação e gratificação do indivíduo." (Alfred 1983: 185).

O satanismo da IS pode ser resumido (embora com cuidadosa atenção ao contexto) nas duas primeiras das "Nove Declarações Satânicas", da Bíblia Satânica:
1. Satã representa indulgência ao invés de abstinência!
2. Satã representa existência vital, em vez de idéias espirituais impraticáveis! (La Vey 1969: 25).

As Nove Declarações são mais detalhadamente exploradas através dos escritos de La Vey, da Black Flame, e também são discutidas em Alfred (1983).

Para nossos objetivos atuais, a estrutura sociológica da IS é importante por duas razões: em primeiro lugar, é indicativa da natureza do satanismo, e em segundo, leva a uma outra organização. A IS difundiu-se como uma série de "pequenas comunidades licenciadas" lideradas por pessoas que podiam demonstrar suas credenciais "satânicas", comprando uma licença e atraindo um grupo. Em 1975, a IS "interrompeu seu sistema de comunidades licenciadas, como um experimento que havia se completado", e, desde então, tem "encorajado de verdade o individualismo e auto-engrandecimento" (Gilmore 1994; ver também Barton 1990: 119, 129). As pessoas que agora se filiam à IS, tornam-se membros de uma rede e são livres para se reunir, o que raramente fazem, valorizando a encorajada independência. A maior ligação entre eles é a Black Flame, publicada em Nova York e distribuída mundialmente. Desta forma, não existe atualmente um grupo organizado chamado a Igreja de Satã. Parece claro, entretanto, que enquanto a IS funcionou com uma série de locais de encontro inter-relacionados, isto dificilmente se ajustou com sua ideologia e estava provavelmente fadado a falhar. A afirmação da individualidade, da excelência pessoal e da auto-indulgência poderia encorajar as pessoas a serem líderes, mas seu sucesso era medido pela falta de seguidores. Este tipo de satanismo não gera coesão grupal e estruturas congregacionais, mas promove o individualismo e o trabalho em rede. Na Grã Bretanha, em 1995, o melhor indicador do tamanho da IS foi a distribuição da Black Flame, e esta indica números realmente muito baixos. Não houve também evidências de nenhum desejo de crescimento, e não tenho visto indicações de que a IS tenha crescido desde então.

Entretanto, apesar da importante e duradoura influência de La Vey e da IS no satanismo contemporâneo, sua abordagem não-metafísica, e sua rejeição de estruturas de graus hierárquicos, tem levado alguns satanistas a formar seus próprios grupos diversos. Um resumo paralelo das alegações sobre um satanismo de várias gerações poderia ser útil, para esclarecer sobre uma implicação do que foi acima mencionado.

Satanismo de várias gerações

Ao contrário da alegação da seção anterior que afirmava ter sido o satanismo iniciado por Anton La Vey nos anos 60 – ou, talvez mais precisamente, que La Vey tomou várias imagens fictícias disponíveis sobre o satanismo e criou uma realidade – algumas vezes afirma-se que o satanismo existe em algumas famílias ou grupos há muitas gerações, tendo sido originado talvez há centenas de anos. Não apenas não encontrei evidências para demonstrar a veracidade de tal alegação, mas estou persuadido de que há boas evidências para questionar a plausibilidade de tal satanismo. As alegações em si são exageradas e inexatas. Exageros incluem afirmações extravagantes tais como dizer que dez por cento da população britânica é satanista. Ao mesmo tempo, costuma-se afirmar que "um membro da família real é satanista", sem nenhuma nomeação pública do acusado. Afirmações semelhantes são feitas em muitos outros países, onde todos os políticos e outras figuras famosas são suspeitas de liderar uma conspiração que inclui um número considerável de outras pessoas e ameaça englobar sociedades inteiras. Em minha pesquisa com uma ampla variedade de satanistas assumidos, ainda tenho que ouvir uma narrativa que é um lugar comum entre a maioria de outros crentes. Wiccans, ou seja, pertencentes ao movimento Wicca, freqüentemente afirmam terem sido iniciadas por uma grande mãe; os cristãos evangélicos freqüentemente afirmam terem sido levados a Jesus por um parente. As únicas pessoas que fazem afirmações similares sobre o satanismo, ainda que vagamente, são aquelas que afirmam terem escapado. Isto é, no mínimo, se o satanismo de várias gerações existe, nunca inclui aqueles que estão felizes por serem satanistas. Mais do que isto, a própria natureza do satanismo requer dúvidas sobre ser ele disseminado dentro de famílias ou no tipo de grupos alegados. (Para uma discussão que chega à mesma conclusão, ver La Fontaine 1998).

O Templo de Set

O Templo de Set (TS) é uma organização internacional que foi estabelecida como uma Igreja sem fins lucrativos na Califórnia, em 1975, recebendo reconhecimento estadual e federal, bem como isenção de impostos mais tarde, naquele ano.

Durante uma pesquisa sobre "Abuso ritual satânico" (Harvey 1995 a), fui abordado por um membro britânico do TS, que estava preocupado com eu poder receber falsas informações com relação ao satanismo e o TS. Após alguma troca de correspondência, o TS concordou (com algum entusiasmo) em distribuir um questionário especificamente destinado a seus membros na Inglaterra. Ambos, o iniciado senior do TS da Inglaterra, David Austen, e o supremo sacerdote do TS, Michael Aquino, disseram que queriam muito que os membros respondessem ao questionário. Publiquei os resultados da avaliação daquele questionário (Harvey 1995 b), e aqui forneço um sumário dos interesses e atividades do Templo. A validade continuada de minha pesquisa prévia foi checada pela referência ao vasto acúmulo de informações, agora facilmente obtidas através de criteriosas pesquisas na internet. (A maioria destas informações era disponível apenas para membros do TS em 1995, mas uma parte delas ficou disponível para mim durante aquela pesquisa).

Pode ser útil começar pela questão dos números. Em 1995, recebi onze respostas ao meu questionário. Quando discuti isto com David Austen em uma entrevista, ele sugeriu que este número girava em torno de vinte por cento dos membros da Grã Bretanha. Acredito plenamente que o TS é a maior organização satanista na Grã Bretanha (e em muitos outros países), e concluo que há menos do que uma centena de satanistas na Grã Bretanha. Entretanto, mesmo estes números podem dar uma falsa impressão. Não conseguimos imaginar uma reunião de cinqüenta satanistas para qualquer objetivo que seja. Jean La Fontaine informa que "de acordo com um membro antigo com quem conversei, que compareceu a muitas reuniões, eles nunca se reuniam em número maior do que doze membros" (La Fontaine 1998: 47). Como na IS, o TS encoraja o individualismo não congregacionista. Os membros se comunicam (especialmente através da internet), mas raramente se encontram.

Os satanistas do TS – talvez pudesse chamá-los de setianos – são, em sua maioria, homens de idade entre vinte e cinqüenta anos. Questões sobre trabalho e orientação sexual fornecem um padrão muito semelhante deste grupo e para o resto da população. A única surpresa (para mim) veio em uma resposta a uma questão sobre afiliações políticas, como demonstrada nos padrões de votação na prévia Eleição Parlamentar. Apesar de tudo que já haviam me dito, eu ainda esperava uma alta incidência de extremismo – em cada um, ou ambos extremos: de direita e esquerda. Entretanto, as respostas revelaram padrões de votação bastante comuns: todos haviam votado nos três principais partidos políticos, incluindo o Liberal Democrata. Certamente há muitos crentes que se conduzem de modo a separar sua política de sua religião (como, na verdade, eles separam outros aspectos da vida em domínios mais ou menos discretos). Entretanto, e também fugindo de teorias de conspiração que poderiam implicar em um plano divergente para infiltrar a sociedade "normal", acredito que estas respostas significam que os satanistas gostam de projetar uma fachada sinistra, mas, na verdade, são muito pouco diferentes de seus vizinhos.

As origens do TS incluem uma deliberada autodiferenciação da IS, mais significativamente na teologia e sociologia. Nas publicações de La Vey e da IS, pode parecer que Satã é compreendido como um ser ontológico, que existe de verdade, de alguma maneira que transcende a realidade comum, uma figura divina. Por exemplo, a Bíblia Satânica (La Vey 1969) parece incluir afirmações revelatórias, algumas em enoque (Enochian) (tida por alguns mágicos como a língua dos anjos). Entretanto, estas deviam ser compreendidas (de acordo com membros da IS) como estímulos simbólicos ou metafóricos para o pensamento, esforço e crescimento pessoal dos tipos valorizados e encorajados pela IS. Isto é, não existe Satã na IS.
A teologia oficial do TS parece um tanto diferente. A compreensão mais próxima da visão "oficial" do TS, é que "Set é um ser real" (alguns membros do TS falam de Satã, mas muitos, ao contrário, falam de Set). Michael Aquino fundou o TS, conforme ele afirma, após uma auto-revelação de Set. Alguém escreveu, respondendo ao meu questionário:

Set é um ser real, que ofereceu sua dádiva da Black Flame para a humanidade. Isto significa que o homem pode se tornar totalmente consciente de si mesmo, em vez de permanecer atado à ordem cósmica.

Mesmo que Set "não seja um deus", ele é claramente compreendido como mais do que uma projeção do desejo ou temor humanos, mais do que um antropomorfismo justificando esta ou qualquer outra religião. Para aqueles entrevistados que insistiram em diferenciar entre Satã e Set, o primeiro é um "falso jogador", um "estereótipo do adversário judaico-cristão" inventado para "justificar sua (dos cristãos) própria e continuada existência (eles precisavam de uma oposição, um lobo nos arredores da vila)", e alguma coisa para "atemorizar os crentes, conduzindo-os a uma adesão submissa aos pronunciamentos dos vários líderes da fé". Estas visões combinam com aquelas eloqüentemente expressas na Bíblia Satânica. Mas muitos setianos vão além, compreendendo Set como uma "entidade incorpórea" real, "uma realidade metafísica ou mística", "uma deidade todo-poderosa que tem faces diferentes. Por um lado, penso que é o mesmo Deus cristão, por outro, é Set", "um guia" e o "Senhor deste mundo", "um antigo deus egípcio, cujas lendas foram distorcidas e se transformou na base do Satã cristão". Alguns setianos consideram Set como "o rebelde arquetípico", "uma figura representando orgulho, interesse próprio e autogratificação", "a coisa indefinível [sic] que separa o homem dos outros macacos" ou "a força impulsionadora na evolução humana". Espera-se que os iniciados "se transformem" (um jargão do TS), isto é, fiquem cada vez mais verdadeiros consigo mesmos, cada vez mais independentes, cada vez mais parecidos com Set: "Como Set era, nós somos; como Set é, nós seremos". A mudança entre a afirmação da realidade de Set e o reconhecimento que esta linguagem poderia ser metafórica, raramente é sistematizada e nunca é problematizada no TS. Se Set é "real" ou não, parece, no fim das contas, não importar muito: seu papel (como um ser ou como uma idéia) é encorajar a auto-exploração daqueles que falam dele (e talvez com ele). Se ele simboliza a diferença entre a humanidade e os animais, ou se esta diferença é uma dádiva de Set (em vez de uma mudança meramente evolutiva) é menos importante do que a tarefa escolhida de se "transformar".

Sociologicamente, o TS também é diferente da IS. Em primeiro lugar, parece que o TS é organizado de modo muito semelhante a outras ordens mágicas. Há semelhanças sociológicas deliberadas em relação a grupos como o Golden Dawn e outros movimentos esotéricos (ver York 1995, e Hanegraaff 1996). Entretanto, a "estrutura de graus" do TS funciona um pouco diferentemente. Não se espera, nem se exige dos iniciados que progridam para aquilo que, em qualquer outro lugar, seriam os degraus mais elevados. No TS, estes são mais de funções administrativas ou de supervisão. Espera-se que a maioria seja do segundo grau, ou Adepto II, uma vez que o TS está mais interessado em que os indivíduos se desenvolvam e encontrem seus próprios níveis, do que em criar uma identidade grupal elevando-se de cada um, seguindo exatamente os mesmos passos. Basicamente, os adeptos são reconhecidos como competentes Magos Negros.

Já discuti em artigo anterior (Harvey 1995 b) o que o TS entende por ambos: "mágica" e "magia negra". Para resumir uma ampla e complexa cosmologia e psicologia, "mágica" é o processo deliberado de operar mudanças de acordo com a "vontade". Há magicas "menores" que poderiam ser a manipulação de coisas ou eventos no universo objetivo (em vez de subjetivo), e mágicas "maiores" que operam mudanças no universo subjetivo. "Vontade" deve ser compreendida paralelamente com as teorias de outros movimentos magicamente orientados, os quais reconhecidamente seguem a tradição agostiniana. Afinal de contas, Alister Crowley não cunhou a frase "Ame e faça o que você quiser", mas derivou-a de Agostinho, talvez via esotéricos cristãos. Algo pode ser chamado "branco" se se elevar de, e expressar a falsa consciência de que o indivíduo está fazendo alguma coisa por razões altruísticas: o benefício dos outros, a glorificação da deidade, alcançar a harmonia com o cosmos ou com algum "Outro". O TS reconhece que uma doação para a caridade é, no mínimo, tanto um ato de autogratificação quanto uma tentativa de ser útil. Para o TS, este truísmo encoraja a autogratificação como a melhor razão possível para a ação. Algo é "negro" quando celebra a consciência do benefício subjetivo (mesmo quando isto inclui o alívio do sofrimento dos outros, por exemplo).

Além da estrutura de graus e o encorajamento da "mágica", o TS é organizado ao redor de uma (não-hierárquica) série de grupos de afinidade chamados Pilares (Pylons), como os portais dos antigos templos egípcios. Os membros destes grupos também nunca devem se encontrar fora do cyber-espaço e outras formas de correspondência. Eles se comunicam em rede sobre tópicos de interesse mútuo que seguem os objetivos do TS: principalmente encorajar o auto-desenvolvimento. Como um reforço final deste ponto freqüentemente repetido, o TS não possui um calendário estabelecido, e encoraja a celebração do aniversário dos indivíduos como o ponto mais importante do ciclo de vida de alguém.

Outros Grupos Satânicos

Há muitos outros grupos satânicos. A maioria deles é pequena, mesmo quando parecem ter uma presença maior. A Order of the Nine Angles (ONA) é um bom exemplo. Um autor prolífico, que usa muitos pseudônimos (p. ex., Anton Long, Stephen Brow e Christos Beest) desenvolveu uma forma de satanismo que é distinguível pela complexidade de sua cosmologia e pela afirmação da sua necessidade de ser sinistra. A primeira (ONA), entretanto, elabora idéias que são territórios comuns para muitos esotéricos e filmes e livros de ficção científica.(p. ex., que o mundo cotidiano não é a única dimensão da realidade), enquanto a última é, quase que com certeza, a apresentação de uma face destinada a chocar. Minha própria (1995 b) discussão sobre este grupo (ou melhor, indivíduo solitário) deve ser comparada à de Kevin Logan (1994) – não por eu não ter certeza de minhas conclusões, mas para demonstrar que estamos tratando de polêmicas que muito freqüentemente estão misturadas com preconceitos e geradas pela autopromoção. Os próprios documentos da ONA são acessíveis via vários websites (por exemplo, "Necronomi" e Satanservice") ao lado de muitas outras organizações e indivíduos.

Magia e Feitiçaria

No caso de ainda restar alguma confusão, apesar das semelhanças entre alguns aspectos da cosmovisão dos satanistas, sua retórica, rituais e aqueles aspectos de grupos de magia maiores, há muitas coisas que definitivamente distinguem o satanismo. As práticas e auto-identidade da feitiçaria também são distintas do satanismo. Os grupos apresentados acima estão preocupados principalmente com o crescimento pessoal dos indivíduos e/ou com o próprio desenvolvimento. Eles são aparentados com a Nova Era por serem corretamente identificáveis com uma religião própria ou espiritualidades próprias. As tradições da feitiçaria ocidental moderna são "religiões da natureza", mesmo quando algumas delas estão profundamente interessadas pelo si-mesmo (p. ex., Crowley 1989). A diferença é que o "si-mesmo" para os religiosos da natureza é relacional, enquanto é completamente individual nas religiões próprias. Alguns tipos de feitiçaria e mágica pagãs não devem ser mais centradas na deidade do que o satanismo, mas suas fundações, objetivos e maneiras são muito diferentes (ver Harvey 1997) .

Por outro lado, a típica polêmica pagã contra o satanismo – de que este divide com o cristianismo sua cosmovisão – é uma má compreensão. Enquanto "Satã" certamente deriva do cristianismo, o Satã dos satanistas está muito longe do caráter bíblico. Satã aqui é mais parecido com um arquétipo jungueano, embora com valores não celebrados por Jung e seus discípulos. O que a cristandade forneceu, provavelmente via imaginação popular e filmes de Hollywood, foi uma imagem sinistra. O que esta imagem ao mesmo tempo esconde e revela, é muito diferente nas várias comunidades possuidoras de discursos que colidem em más compreensões sobre o que cada uma quer dizer. Minha suspeita é que alguns satanistas, no mínimo, estão felizes com estes choques de incompreensões, que continuam a fazê-los parecer mais sinistros. Entretanto, meu objetivo nesta seção é apontar que enquanto alguns satanismos poderiam ser mágicos, a maioria dos grupos de magia possui uma natureza muito diferente.

Abuso satânico ritual

Nos anos 80 e 90, na Grã Bretanha e em outros lugares, alastrou-se um pânico com os rituais de abuso e assassinato de crianças e adultos. As alegações e controvérsias não permaneceram na arena das teorias de conspiração popular, mas tornaram-se assunto de investigações policiais e casos de júri. A mais abrangente pesquisa e publicação sobre este tema é o excelente Speak of the Devil (Discurso do diabo), de Jean La Fontaine (1998). Não é de surpreender que a maioria dos debates tenha sido alimentada por cristãos evangélicos conservadores. Mais interessante é o papel das comunidades psicoterapêuticas, porque isto nos diz mais sobre tendências em sociedades contemporâneas. Por exemplo, La Fontaine (1998:191) conclui que "algumas terapias exibem uma abordagem às alegações de abusos satânicos que encorajam a crença e desencorajam o ceticismo de um modo semelhante àquele dos fundamentalistas". Isto sozinho é um poderoso indicador das tensões problemáticas da modernidade (incluindo a recente – ou pós-modernidade) entre um questionamento crítico e a dominante autoridade dos especialistas. Os acadêmicos se dedicam a levantar questões e continuar o debate. A superabundância de acusações requer estudos, mas o que é mais interessante (para a academia) é a questão sobre o quanto é possível legitimar conhecimentos particulares.

Ao lado disto, La Fontaine traça paralelos entre noções muito bem estabelecidas de que acusações de feitiçaria, bruxaria ou práticas do mal tornam-se abundantes em períodos de mudanças sociais e de incertezas. O fato de os pânicos recentes concentraram-se sobre a segurança das crianças, aponta significativamente para uma nostalgia infiltrada, por um passado mítico quando crianças eram (supostamente) habitantes valorizados de famílias estabelecidas com valores e papéis "tradicionais". O fato é, entretanto, que as acusações feitas não constituem nada de novo. Muitos grupos mais ou menos marginais (judeus, mórmons, maçons, católicos, protestantes, africanos, pagãos, comunistas e muitos mais) têm sido vítimas de acusações semelhantes no passado. Realmente, muitos desses grupos ainda são suspeitos para outros grupos (especialmente, é claro, para os cristãos evangélicos), como mostra uma recente reportagem do LA Times (Faucett 2002). Uma pesquisa na internet por informações sobre Satã ou satanismo gerará muitos links relacionados a sites que fazem acusações reconhecidamente semelhantes àquelas feitas aos outros no passado. Negar simplesmente, não é suficiente, apesar do peso da evidência que aponta para a falsidade das acusações de uma conspiração satânica envolvendo mortes sacrificiais e abusos sexuais. (O acréscimo da palavra "ritual" a "abuso" é somente polêmica, e tenta desviar a atenção da violência diária comum contra as crianças em famílias comuns, e mesmo "tementes a Deus". Cashman 1993: 47 é instrutivo aqui.) Nós certamente aprendemos muito sobre os acusadores ao considerar suas construções de alteridades. Mas o pesquisador deve se misturar naquele mundo perigosamente carregado das especialidades e conhecimento público. Algumas vezes isto pode aparecer como colaboração e parece provar a visão dos "conspiradores" (cf. Beit-Hallami 2001). Permanecer acadêmico, portanto, é continuar a formular questões (incluindo, e talvez especialmente, as reflexivas) muito mais do que se transformar em um especialista em descrever um fenômeno. Meu papel como "especialista" é testado a cada vez que a mídia se interessa pelo suposto satanismo. Portanto, é com o mais recente interesse da mídia que eu concluo esta discussão.

Assassinos vampiros satânicos

Além dos membros adultos dos grupos assumidos como satanistas, há, sem dúvida, adolescentes que se identificam como satanistas. O que eles querem dizer com isto varia consideravelmente. Mesmo em um grupo ad hoc de adolescentes masculinos, com quem me encontrei nas ruas de uma cidade da Grã Bretanha em 1995, as compreensões variaram. Só um tinha lido os livros de La Vey e conhecia a revista Black Flame. A maioria não se interessava por tais fontes que pareciam muito próximas a um conhecimento teórico. O satanismo deles era uma afirmação de sua "rebelião" e se manifestava em roupas pretas e simbolismos ocultos. Não importava que os símbolos fossem amplamente ocultos para o grupo; a única coisa que importava, era a hostilidade e/ou o medo que os símbolos provocavam nos outros. Estes adolescentes consideraram as pinturas grosseiras dos grafites "satânicos" como infantis, especialmente em comparação com o complexo trabalho artístico de grafiteiros (graffiti artists) mais talentosos. Deste modo, enquanto a polícia e alguns cristãos do lugar estavam preocupados com o que geralmente eram representações criativas ou imagens fantasiosas (de histórias de terror, literatura infantil ou iconografia de bandas de rock), estes "satanistas" se contentavam em ser e vestir suas próprias auto-representações. Nenhum foi abordado por membros de outros grupos de satanistas, nenhum sabia sobre satanistas mais velhos (exceto aquele que havia lido La Vey, e até esse conhecimento era apenas literário). Atualmente, é bastante improvável que qualquer um daquele grupo continue com tal auto-imagem ou auto-apresentação. Alguns podem ter se transformado em "góticos" (goths), mas minha suspeita é que uma vez que seus hormônios sosseguem, eles mudaram.

Entretanto, a aparência "gótica" desses adolescentes não é somente uma afirmação de moda para adolescentes. Há "góticos" mais velhos. Entre eles, há alguns que são profundamente atraídos pela imagem do vampiro. Como a maioria dos satanistas, eles sabem que imagem é só imagem, mas que a "mera imagem" pode evocar respostas poderosas nos outros. Assim, eles (satanistas e vampiros) podem brincar com suas imagens escolhidas. Entretanto, alguns "vampiros" recentemente parecem ter levado sua imagem muito mais seriamente. No cenário do clube vampiro, eles adquiriram maneirismos e costumes, e substituíram alguns de seus dentes por caninos de animais, para que ficassem mais parecidos com o estereótipo do vampiro. Nestes clubes mesmo, onde estas imagens e papéis são desempenhados, alguns favorecem a bebida de sangue supostamente fornecido por "vítimas". Entretanto, Manuela e Daniel Ruda vieram a acreditar que eles fossem realmente vampiros. Por um momento em fevereiro e março de 2002, a mídia mundial parecia obcecada pelo "satanismo vampiro". The Times (18 de janeiro de 2002) mostrou que "satanistas culpam o diabo por 666 mortes rituais". Isto e reportagens semelhantes do caso do julgamento alemão (onde se diz que os Ruda haviam admitido o assassinato, mas negavam a culpa porque "o diabo dissera-lhes para fazer aquilo") incluem queixas sobre uma onda de assassinatos e suicídios inspirados pelo satanismo na Europa. Mais do que examinar este novo conjunto de queixas e acusações, pretendo levantar algumas questões que levam a uma conclusão de interesse acadêmico.

Se Manuela Ruda pediu um transplante de dentes para ficar parecida com o personagem fictício de Bram Stoker, ela é realmente uma vampira? Se a resposta for "sim, mas somente porque nós devemos permitir às pessoas suas próprias auto-identificações", nós, (doutores em religião) temos que aceitar a definição implícita dela sobre os vampiros? Se uma vampira não é uma eterna "criatura da noite" que vive somente se beber sangue de vítimas, mas alguém que toma os estereótipos de Hollywood pela realidade e tenta arduamente viver sua fantasia, pode alguma coisa que ela afirmar sobre o satanismo carregar algum peso? As fantasias dos vampiros self-made combinam com aquelas dos cristãos evangélicos, construtores do satanismo como genuinamente satânico? Se sim, o que significa estes oponentes do catolicismo (entre outras coisas) estarem enamorados de uma representação católica medieval do diabo? Enquanto isso, aqueles interessados em satanistas assumidos deveriam perguntar: a) se é possível excluir aqueles cujo satanismo é realmente focado na obediência "ao diabo" mais do que na auto-identificação, e b) se a afirmação "o diabo me fez fazer isto" significa que todos os satanistas devem ser suspeitos de serem criminosos? Em resumo, há muitas coisas muito diferentes que são chamadas de satanismo. Estas diferenças são importantes e não devem ser confundidas. A maioria de satanistas assumidos está engajada em uma religião que é muito diferente daquilo difamado como satanismo pela maioria das outras pessoas. Realidades e acusações podem ser instrutivas sobre uma legião de tópicos importantes e fascinantes, mas que nunca deveriam ser confundidos. Tentativas de compreender a natureza das sociedades contemporâneas deveriam ser amplamente seguidas pelo reconhecimento de que não somente as pessoas identificam-se como satanistas (o que significa muitas coisas diferentes), mas que também as pessoas continuam a acusar outras de serem satanistas. A continuação desta retórica diz muito sobre a era em que vivemos.

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WEBSITES (acesso em 9 de maio de 2002)
LA Times:
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Necronomi: http://www.necronomi.com/magic/satanism/
Satanservice: http://www.satanservice.org/smackers.html
SUBVERSÃO MÁGICA: UMA INTRODUÇÃO À MAGIA DO CAOS
por Daniel Pellizzari

Nada é verdadeiro, tudo é permitido! Este mote, geralmente atribuído à fantástica figura de Hassan-i-Sabbah, é o estandarte da mais jovem das correntes mágicas ocidentais: a Magia do Caos. Transcendendo o conceito ortodoxo de "ocultismo", os Caoístas procuram transmutar todos os aspectos de sua existência em atos deliberados de criação, destruição e diversão. Para isto, misturam Magia, Ciência e Arte, evitando sempre cair na armadilha de levar qualquer coisa demasiadamente a sério. Seja bem-vindo às marés do Caos, onde todo homem é Shiva e toda mulher é Kali.

*algumas peças de um quebra-cabeça fractal*

Pode-se dizer que o precursor da Magia do Caos foi o artista plástico inglês Austin Osman Spare (1886-1956). Criador de um sistema mágico extremamente pessoal, denominado Zos Kia, Spare foi tão inovador que chegou a ser evitado até mesmo pelo bicho-papão Aleister Crowley, que o acusava de ser um mago negro.

Expor as minúcias do sistema de Spare demandaria muito espaço e fugiria do objetivo deste artigo. O importante aqui é lembrar que Spare foi o primeiro a romper completamente com a tradição dos sistemas mágicos
[1], ao criar um método eficaz usando como única matéria-prima seus próprios insights. Com seus Sigilos, Atavismos, Posturas de Morte e Alfabetos do Desejo, Spare deixou claro que qualquer um pode criar um sistema mágico que funcione. Não é necessário que ele seja útil ou compreensível para os outros; se isso acontecer, o mérito não é do sistema, mas do magista que obtém o sucesso. Sua brilhante obra artística, indissociável de seu trabalho mágico, mostrou a todos que a Arte é um dos mais eficazes instrumentos do Adepto. O legado de Austin Osman Spare permaneceu obscurecido até os anos setenta, quando veio à tona a primeira de suas crias: a IOT (Illuminates of Tanatheros).

Surgida na Inglaterra, a IOT foi o primeiro grupo a utilizar o termo "Magia do Caos" para suas atividades. Os principais responsáveis por seu surgimento foram Ray Sherwin e Peter Carroll, que até hoje se mantém no controle da Ordem. Anunciada como "herdeira mágica dos Zos Kia Cultus e da A.'. A.'.", a IOT sacudiu o cenário ocultista inglês com a extrema originalidade de suas práticas. Com a publicação do The Book of Results de Sherwin e do Liber Null de Carroll, iniciou-se o caminho da Magia do Caos. Em pouco tempo, diversos indivíduos e grupos proclamaram sua adesão ao Caos, cada um deles dando sua colaboração inigualável ao desenvolvimento da mais libertária das correntes mágicas. Um deles, os Stoke Newington Sorcerers (SNS), estiveram envolvidos com o início do movimento punk na Inglaterra.

Na década anterior, nos Estados Unidos, dois hippies zen chamados Greg Hill e Kerry Thornley criaram o Discordianismo, uma religião dedicada ao culto de Éris, a deusa grega da discórdia. Esta religião, sobre a qual você vai conhecer mais e entender menos se ler seu livro sagrado, o Principia Discordia, consiste em um aglomerado de doutrinas nonsense, cheias de humor e de sabedoria inusitada.

Proclamando que "cada homem, mulher e criança é um papa", os discordianos afirmaram o elemento do humor e da irreverência como algo de suma importância em qualquer caminho transcendente. Quando se encontrou com a Magia do Caos, a paixão foi imediata. Hoje em dia há poucos Caoístas que não guardem um lugar para Éris em seus lotados altares.

Outra contribuição norte-americana para o que hoje é conhecido como Magia do Caos foi o trabalho dos psicólogos outsiders Timothy Leary
[2] e Robert Anton Wilson. Entre muitas outras coisas, Timothy Leary desenvolveu a teoria dos Oito Circuitos da Consciência, muito utilizada por Caoístas que acham a Árvore da Vida cabalista demasiadamente barroca. As contribuições de Wilson (RAW, para os íntimos) são inestimáveis. Sem ele, os Caoístas nunca enxergariam os fnords(3)[3]. Seus trabalhos ficcionais são hilariantes e prenhes de insights, seus ensaios traçam labirintos na mente mais cética (ou na mais crédula) e sua autobiografia, Cosmic Trigger, é de dar inveja. Não visite os Illuminati sem um livro de RAW embaixo do braço.

Continuando no campo das influências acumuladas pela Magia do Caos em sua história, recebemos a visita do anarquista sufi Hakim Bey. Seu extenso panfleto T.A.Z. caiu como uma bigorna na comunidade Caoísta. Anunciando cada indivíduo como um avatar do caos e pregando sua reunião em "zonas autônomas temporárias"(4)
[4], Hakim Bey estabeleceu a subversão ontológica como uma das práticas mais acalentadas pelos praticantes da Magia do Caos. A partir do trabalho de Bey, o Caoísmo tomou os contornos de uma verdadeira "Nova Esquerda", como exposto na última edição da Safira Estrela por Pedro Raul de Medeiros.

O crescimento e popularização da Internet tornaram-na um componente importantíssimo para o desenvolvimento da Magia do Caos. As facilidades de comunicação e difusão de informação e as inúmeras possibilidades oferecidas pela Rede parecem ter sido criada por encomenda! para os caoístas.

Além da Psicologia
[5], outros campos da ciência foram muito importantes para as experiências Caoístas, como a Física Quântica, a Cibernética, a Lingüística e a Informática, que foram deglutidas antropofagicamente e misturadas à Magia.

Nos últimos tempos, surgiu um debate entre alguns Adeptos, que se dividiram entre "Cientistas" e "Místicos". Os primeiros são mais pragmáticos e tentam explicar a ação da magia através de equações e gráficos vetoriais, negando a validade da experiência transcendente. Já os místicos defendem que a Magia do Caos não é simplesmente uma forma pós-moderna de baixa magia, e que pode ser utilizada para fins de Iluminação. Minha opinião pessoal é a de que ambos os grupos estão sendo atuzicados pelo velho demônio Choronzon. Lembro sempre do mote cunhado por Aleister Crowley para seu Equinox: "O Método da Ciência - A Meta da Religião".

Isto é a Magia do Caos: um conjunto de influências aparentemente conflitantes que resultaram em um conjunto de práticas extremamente heterogêneo, ainda que surpreendentemente eficaz.

*esboço para um catecismo caoísta*

Pela própria natureza da Magia do Caos, torna-se um desafio definir os pontos comuns entre os g!rupos e indivíduos que a praticam. Saiba que este artigo é apenas uma tentativa, e que qualquer Caoísta teria o maior prazer em negar qualquer uma das afirmações abaixo - apenas para confirmá-la algum tempo depois. Dentro da Magia do Caos, não há problema algum em contradizer-se, desde que com estilo. Isso faz parte da prática.

Antes de mais nada, a principal mensagem da Magia do Caos é a seguinte: a Magia deve ser essencialmente prática. Isso pode parecer tolo à primeira vista, mas quando você se depara com a quantidade de esforço desperdiçado com as elocubrações teóricas e debates territoriais tão comuns no mundo esotérico, a afirmação começa a fazer mais sentido. O Caoísmo tenta demonstrar que o importante são os resultados, relegando o método utilizado para obtê-los à categoria de mero detalhe.

Pode-se dizer que o uso de crenças como ferramentas é a base do trabalho Caoísta. Assim, o praticante se esforça para conhecer e experimentar o maior número possível de sistemas de crença, apropriando-se do melhor de cada um deles.

Quando surgir a necessidade, o mago estará tão bem instrumentalizado que saberá qual delas utilizar para resolver a situação. A crença só é necessária no momento da operação; o ideal é que o praticante não acredite em nada, nem mesmo na crença básica de que as crenças são apenas ferramentas. Assim, pode surgir o Vácuo onde toda a Magia se realiza.

Derivando diretamente do princípio anterior, surge a visão do Caoísmo como um meta-sistema, ou seja, um sistema de sistemas. Isso quer dizer que a Magia do Caos engloba sem pudores qualquer outro sistema - mágico, místico, religioso, filosófico ou coisa que o valha -, existente ou não. Essa capacidade surge a partir da percepção de que nada tem um sentido intrínseco; as coisas apenas são. Quem dá sentido e cria realidades é um macaquinho orgulhoso que brinca de demiurgo.

Quando isso fica claro, qualquer coisa torna-se permissível. Isso deixa o Adepto Caoísta completamente livre para adicionar à sua prática quaisquer influências que achar necessárias, do Budismo Vajrayana até a Pajelança. Experimentar é a palavra-chave.

Os praticantes de Magia do Caos procuram se submeter a constantes processos de decondicionamento. Neste trabalho, fazem uma auto-análise e descobrem que crenças ou comportamentos estão sendo favorecidos em detrimentos de outros. A partir daí, usando processos de anátema pessoal, submetem-se às crenças que seu ego mais rejeita. Através deste processo de desconstrução, o praticante percebe a relatividade e validade de qualquer conceito. Existem diversas práticas de anátema, quase todas com o objetivo de livrar o Adepto das amarras do ego. Alguns anátemas pessoais: quebrar ou se livrar de um objeto muito querido, realizar mudanças radicais em seu aspecto exterior ou mudar o tipo de alimentação (por exemplo, um vegetariano pode passar longos períodos comendo apenas carne vermelha).
Outra tônica do mundo Caoísta é a forte dose de humor e irreverência em algumas práticas e declarações, herança direta da já citada Sociedade Discordiana.

Magos caóticos não costumam levar nada muito a sério, por estarem atentos à relatividade de todos os fenômenos. Percebendo o Universo como uma grande brincadeira de gosto duvidoso, está aberto o caminho para uma postura lúdica.

Qualquer coisa é possível, inclusive aproveitar a energia da egrégora de Papai Noel para fins mágicos
[6]. Além do mais, até um iniciante na Magia do Caos sabe que a gargalhada é uma das maiores formas de banimento. Se algo der errado em qualquer aspecto de sua vida, não há melhor remédio do que dar boas risadas.

Muitos magos caóticos utilizam o termo gnosis para definir o estado de vacuidade ideal para a realização da Magia (o termo é mais abrangente, mas esta é outra história e fica para a próxima). Este estado pode ser alcançado de várias maneiras, como repetir de forma monótona algum som sem sentido específico, engajar-se em atividades sexuais repetidas até a exaustão ou caminhar em círculos até perder completamente o senso de direção. O objetivo é sempre destruir a influência nociva da mente consciente no resultado do trabalho mágico. A gnosis é parte essencial de uma das principais práticas da Magia do Caos: a Sigilização.

Criada por Austin Osman Spare e aperfeiçoada por diversos Adeptos, a Sigilização é um método simples e eficaz de obter resultados. Basicamente, ela consiste na redução de um desejo a uma unidade mínima, que será então carregada magicamente durante o estado de gnosis para então ser libertada no Vácuo.

Esta unidade mínima pode ser um mantra, um desenho, um som ou qualquer outra coisa, desde que não guarde semelhanças com desejo que o originou. Se até agora a Sigilização lhe pareceu complicada, vamos a um exemplo:

O desejo (sempre imperativo), é: VOU MUDAR DE CIDADE.

Reduza as letras do desejo, cortando as letras repetidas: VOUMDARECI.

Rearranje as letras para criar um sigilo mântrico: DIVUCOREMA.

Crie um sigilo pictórico utilizando as letras:

Prepare seu espaço mágico utilizando a forma de ritual de abertura que preferir.

Comece a cantar o mantra enquanto realiza qualquer forma de atividade que leva à gnosis. Quando sentir que suficiente energia foi acumulada, direcione-a com os olhos para o sigilo pictórico.

Feche os olhos, descanse e realize um banimento com gargalhadas.

Esqueça.

No Caoísmo, os resultados têm extrema importância. Sistemas e práticas costumam ser julgados de acordo com sua eficácia. Junte isto com a preocupação com ecletismo, excelência e humor, e o resultado é um magista incrivelmente engenhoso, excêntrico e sem pudor de experimentar. Qualquer coisa é matéria-prima para as ações mágicas mais não-ortodoxas. Como exemplo do tipo de coisa que um Caoísta é capaz, acompanhe a descrição deste trabalho
[7]:

"Criei um pequeno Servidor para fins de acúmulo de energia. Ele tem alguns cristais de quartzo, um seletor de intensidade, algumas resistências, um 'seletor de canais' (veja abaixo), alguns fios e um velho chip de 286. Oh, e uma entrada para meu mecanismo de descarga. Inicialmente, eu o carreguei durante uma rave de 72 horas. Enterrei-o no chão sob a pista de dança principal, com alguns fios ligando-se às luzes e aos auto-falantes, outros seguindo até a área de descanso e outros para um antena de satélite (apontando para a casa onde se realizava a rave), que fiz a partir de uma calota velha. O seletor de canais foi a solução para um problema que me foi apontado por k-Ouranos: como eu poderia controlar todos os diferentes tipos de energia? Bem, tudo que fiz foi adicionar um seletor de oito fases, uma para cada cor da magia! Ligando o seletor à CPU, transplantei então a energia de um servidor que eu havia criado para me alertar de ataques mágicos, adicionei algumas resistências para eliminar a possibilidade de uma sobrecarga e PRESTO! Minha máquina estava pronta. O mecanismo de descarga (não riam) é um pente de alumínio! Eu apenas adicionei algumas peças eletrônicas, e um fio para ligá-lo à bateria. Este aparelho me foi mostrado em um sonho por Karl Marx (sem o seletor de canais), e funciona MUITO BEM! Eu preciso apenas pentear meu cabelo quando preciso de uma dose extra de energia. Eu o mantenho ligado à antena de satélite, que agora aponta para uma igreja próxima à minha casa, apenas para mantê-lo com carga total."

Com certeza, a maioria dos leitores deve estar surpreso, mas esta é uma reação precipitada. Os feiticeiros (e a raiz atávica da Magia do Caos está na Feitiçaria e no Xamanismo) sempre fizeram uso dos materiais que estavam à mão. Se ninguém estranha o uso de plantas nos feitiços tradicionais, porque deveria achar inadequado o uso de peças eletrônicas? Hoje em dia, vivendo em centros urbanos, estamos cercados por computadores, e não por florestas. Os novos Grimórios serão escritos com silício.

*colméias, bandos, matilhas & alguns rabanetes*

A IOT não passou incólume por todas as modificações sofridas pela Magia do Caos desde os anos setenta. Criada originalmente para ser um fórum livre de associação de Adeptos do Caoísmo, a Ordem sempre procurou manter um mínimo de hierarquia - um erro grave, de acordo com seus críticos. De seu formato original, evoluiu para O Pacto e a partir daí enfrentou alguns cismas.

Alguns dos Adeptos que deixaram a IOT (entre eles um de seus fundadores, Ray Sherwin) criaram novos grupos, a maioria deles tendo em comum o fato de não utilizarem qualquer tipo de hierarquia. Estes indivíduos perceberam que, por mais que se tente, não é possível conduzir um trabalho em Magia do Caos dentro de uma estrutura que favorece disputas e jogos egóicos. Com freqüência argumentam que a hierarquia pode ser boa para outras correntes mágicas, mas no Caoísmo, onde o indivíduo é o soberano de suas próprias realidades, ela só serve para limitar qualquer tipo de avanço.

Atualmente existem muitos grupos e indivíduos trabalhando sob a égide do estandarte Caoísta. Um dos grupos mais importantes é o Z(cluster), criado por um grupo de norte-americanos inspirados pelas idéias de Hakim Bey e pelas possibilidades da Internet. Foi a primeira grande rede internacional de Adeptos da Magia do Caos, contando com membros em quase todo o planeta. Outros grupos que merecem atenção por parte do estudante são a Autonomatrix, o Thee Process (ex-TOPY) e a Telesis Foundation.

No Brasil, a Magia do Caos está começando a se estabelecer como uma corrente mágica. Seu representantes atuais são o Pacto Gnóstico NOX e a IOT Brasil. NOX nasceu de um grupo afiliado ao Z(cluster), denominado kaZakaotika.

Consiste em uma Rede de Adeptos Caoístas, espalhados pela América do Sul. Cada grupo de trabalho, denominado Vórtice, é completamente independente. Não há nenhum tipo de hierarquia dentro do Pacto. Os Irmãos de NOX mantém sua identidade através do uso comum do Sigilo do Pacto e do Panlogos, uma Invocação criada em conjunto por todos os Vórtices. Seu principal objetivo é fornecer um meio de comunicação e troca de experiências entre os praticantes da Magia do Caos, considerando a colaboração de cada Indivíduo como única e inestimável. Outra característica do NOX é a realização de Projetos Inter-Vórtices, sendo que atualmente estão envolvidos na criação de uma língua bárbara.

Assim como o NOX, a IOT Brasil ainda está em fase de organização. A Ordem funciona de acordo com os princípios expostos no Liber Pactionis, de Peter Carroll. Mais informações sobre suas atividades podem ser obtidas diretamente de seus representantes (vide próximo tópico).

*papirografia caótica & lugares para visitar*

Este artigo foi apenas uma tentativa de dar uma visão geral de um assunto vastíssimo. Para quem se interessou pelo assunto, recomendo a leitura de alguns livros. Infelizmente, quase todos (com exceção de dois) são em inglês.

The Book of Pleasure, Austin Osman Spare
The Book of Lies, Aleister Crowley
The Book of Results, Ray Sherwin
Liber Null & Psychonaut, Peter Carroll
Condensed Chaos, Phil Hine
Visual Magick: A Manual of Freestyle Shamanism, Jan Fries
Prometheus Rising, Robert Anton Wilson
Schrödinger's Cat Trilogy, Robert Anton Wilson
Alice no País das Maravilhas, Lewis Carroll
TAZ: The Temporary Autonomous Zone, Hakim Bey
All Rites Reversed: Ritual Technology for the New Age, Antero Alli
Undoing Yourself, Christopher S. Hyatt
Principia Discordia, Malaclypse the Younger
Ciberxamanismo, Eduardo Pinheiro

Visitar os seguintes websites pode valer tanto quanto ler os livros acima.
. Tools of Chaos (
www.crl.com/~tzimon)
. Chaos Matrix (
www.sonic.net/~fenwick)

Nunca se esqueça: a leitura é útil, mas as práticas devem ser experimentadas assim que for possível.

Para entrar em contato com o Pacto Gnóstico NOX, utilize os seguintes endereços (por enquanto, apenas na Internet):
NOX - WebVórtice (
www.psynet.net/nox)
NOX - e-mail (
nox@psynet.net)

Por fim, os endereços da IOT Brasil:

IOT-BR - Website (
www.openlink.com.br/kaos)
IOT-BR - e-mail (
kaos@openlink.com.br)
Isto é o fim (ou não)

Engendrada por um artista plástico renegado e estabelecida na mesma época em que surgiu o punk rock e que a Física Quântica ganhou respeitabilidade, a Magia do Caos nunca parou de crescer, estendendo seus tentáculos lovecraftianos por todo o mundo e declarando que você pode - e deve - ser seu próprio Messias.

Em nome das ensandecidas hostes do Caos, novamente lhe dou as boas-vindas. Esteja preparado: os arautos do apocalipse estão batendo à sua porta. Entre outras coisas, estes punks do ocultismo pretendem mostrar que o Universo termina e recomeça cada vez que você respira; sim, termina e recomeça cada vez que você respira.

O PRINCÍPIO DA DISCÓRDIAAri Almeida e Mojo
Um cachorro-quente muito gostoso e uma manhã curitibana muito fria despertaram em mim um estranho senso de espiritualidade & lembrei que, no fim das contas, sou um cara religioso. Mais uma sincronicidade impressionante que me aconteceu nesta mesma manhã dia UM de julho, o número do ônibus era 23. Incrível não? Cachorros-quentes e o número 23 e 23 é o número sagrado do Discordianismo e Ari almeida é um Discordiano. Na verdade (dizer "na verdade" quando se está falando de discordianismo é meio bobo, mas vá lá), o número sagrado é o 5, mas essa é outra história. O Discordianismo é uma religião freak criada nos EUA, no início dos anos 60. É um aglomerado de nonsense com mitologia grega, religiões orientais e anarquismo, onde "todo homem, toda mulher e toda criança são um Papa". O Conluio Joshua Norton (sabem quem foi? fica pra uma próxima), que veio a originar todos os outros, se definia como "somos uma tribo de filósofos, teólogos, magos, cientistas, artistas, palhaços e maníacos similares que estão intrigados com ÉRIS, DEUSA DA CONFUSÃO, e com Seus Atos". Você aprenderá mais e entenderá menos sobre os discordianos se ler seu livro sagrado, o Principia Discordia. O nome completo do livro é "Principia Discordia (ou Como Encontrei A Deusa e o Que Fiz a Ela Quando A Encontrei), Onde Se Explica Absolutamente Tudo Que Vale a Pena Saber Sobre Absolutamente Qualquer Coisa", e foi escrito pelo profeta Malaclipse, o Mais Jovem. Por trás deste simpático heterônimo estão Greg Hill e Kerry Thornley, dois vagabundos pós-beatniks e pré-hippies que disseram ter escrito o Principia após serem contactados por Éris, a deusa grega da discórdia. Para quem não lembra, Éris foi a causadora da guerra de Tróia, quando forçou uma disputa para decidir quem era a mais bela de todas as deusas. O pomo da discórdia, feito de ouro e com a inscrição "kallisti" ('para a mais bela') é um dos símbolos do Discordianismo. O Principia começou de leve, mimeografado e distribuído em escolas e universidades, e em poucos anos tinha virado um verdadeiro culto. Existem milhões de histórias esdrúxulas conectadas com o Principia, a maioria cheia de nuances paranóicas. Só para dar uma noção, Kerry Thornley foi companheiro de quarto de Lee Harvey Oswald - suposto assassino do presidente Kennedy - (e participa da coletânea de contos de ficção científica transgressores "Futuro Proibido", recém lançada pela Conrad), e algumas das primeiras cópias do Principia foram tiradas no escritório de Jim Garrison (o advogado que defendia a tese conspiratória para o assassinato de JFK). Os membros mais antigos da religião até hoje juram de pés juntos que a saudação dos hippies é um plágio do cumprimento discordiano (dois dedos para cima, três para baixo... oh! 23!). Depois do lançamento da trilogia "Illuminatus!", de Robert Anton Wilson e Bob Shea, a religião explodiu no weirdo underground dos EUA e da Europa, arrebatando milhares de adeptos auto-proclamados. Hoje em dia existem alguns herdeiros criativos da religião discordiana (como a Church of the SubGenius e a Church of Euthanasia), além de RPGs ("Illuminati", "INWO"), um provedor (
http://www.io.com), vários websites, um grupo de Usenet (alt.discordia) e mil outras paradas de nerd metido a freak. É fácil reconhecer um discordiano: ele vê fnords por toda parte e sempre está procurando ocorrências bizarras do número 23. Mas é isso aí. Para quem é chegado em nonsense e excentricidades, O "Principia Discordia" é um livro essencial. Dá pra encontrar versões ASCII na web (tem uma em http://www.cs.cmu.edu/~tilt/principia/), e uma versão em portugês (com ilustraçõese tudo em: http://www.fnords.blogger.com.br mas legal mesmo é ler a versão original, cheia de colagens meio Monty Python e com uma diagramação podre de fuleira. É hilária, insuperável e baratésima (tem na Amazon). Para delírio da massa esquerdista & ativista & pro intolerantes de plantão, grudarei aqui três pedaços do Principia, numa tradução ligeira que fiz em uma noite de demência criativa (como todas as outras) ___________________ O PENTABARF : OS CINCO MANDAMENTOS DISCORDIANOS *O PENTABARF foi descoberto pelo ermitão Apóstolo Zaratud no Quinto Ano da Lagarta. Ele o encontrou gravado em pedras gêmeas, enquanto construía um teto solar para sua caverna, mas seu significado se perdeu, pois estava escrito em uma cifra misteriosa. Entretanto, após 10 semanas & 11 hs de escrutínio intensivo, ele discerniu que a mensagem poderia ser lida se ficasse de cabeça para baixo e a lesse invertida. SAIBA DISTO, Ó HOMEM DE FÉ! I - Não há Deusa além da Deusa e Ela é Sua Deusa. Não há Movimento Erisiano além do Movimento Erisiano e é o Movimento Erisiano. E cada Batalhão da Maçã Dourada é o adorado lar de um Verme Dourado. II - Um Discordiano Deve Sempre usar o Sistema Discordiano Oficial de Numeração de Documentos. III - Durante sua primeira Iluminação, se Requer de um Discordiano que Saia Sozinho & Partilhe Alegremente de um Cachorro-Quente na sexta-feira; esta Cerimônia Devocional serve para Protestar contra os Paganismos populares do Dia: da Cristandade Católica (nada de carne na sexta-feira), do Judaísmo(nada de carne de Porco), dos Povos Hindus (nada de carne de Gado), dos Budistas (nada de carne de animal) e dos Discordianos (nada de Pães de Cachorro-Quente). IV - Um Discordiano não deve Partilhar de Pães de Cachorro-Quente, pois Este foi o Consolo de Nossa Deusa quando Ela foi Confrontada com a Esnobada Original. V - Um Discordiano é Proibido de Acreditar no Que Lê. ESTÁ ESCRITO! QUE ASSIM SEJA. AVE DISCORDIA! OS QUERELANTES SERÃO TRANSGRESSICUTADOS. _______________________ UMA HISTÓRIA ZEN por Camden Benares, O Conde de Cinco Diretor do Conluio Campo Dócil Um jovem sério achava perturbadores os conflitos norte-americanos da metade do século XX. Dirigiu-se à muitas pessoas procurando uma maneira de resolver dentro de si a discórdias que o aborreciam, mas permaneceu aborrecido. Uma noite, em uma cafeteria, um Mestre Zen Auto-Ordenado lhe falou, "Vá até a mansão dilapidada que encontrarás neste endereço que te escrevi. Não fale com os que vivem lá; deves permanecer em silêncio até que a lua se levante amanhã à noite. Vá até a grande sala à direita do corredor principal, sente em posição de lótus no topo dos escombros do canto nordeste, vire-se para o canto e medite".
Ele agiu como instruído pelo Mestre Zen. Sua meditação foi interrompida freqüentemente por preocupações. Ele se preocupava se os encanamentos cairiam ou não do banheiro do segundo andar para se juntar aos canos e outros lixos sobre os quais ele estava sentado. Ele se preocupava sobre como saberia quando a lua se erguera na próxima noite. Ele se preocupava com o que as pessoas que caminhavam pela sala diziam a seu respeito. Sua preocupação e meditação foram perturbadas quando, como em um teste de sua fé, merda de passarinho caiu sobre ele do segundo andar. Naquele momento, duas pessoas entraram na sala. A primeira perguntou à segunda quem era o homem que estava sentado ali. A segunda respondeu: "Alguns dizem que ele é um homem santo. Outros dizem que ele tem merda na cabeça." Ouvindo isto, o homem se iluminou. ====================================================== ENTREVISTA COM MALACLIPSE, O MAIS JOVEM Alguns excertos de uma Entrevista com Malaclipse, o Mais Jovem, pelo BOLETIM E RELATÓRIO INTERGALÁCTICO DO MAIOR YORBA LINDA DIÁRIO-FOLHA-NOTÍCIAS-HORA-JORNAL-CIRCULAR-FOLHETO METROPOLITANO E DO CONLUIO SOCIEDADE DISCORDIANA DE SAN FRANCISCO & PAPA PUP. GRANDE PUP: Você é sério ou o quê? MAL-2: Às vezes eu levo o humor a sério. Às vezes eu levo a seriedade com humor. De qualquer forma, é irrelevante. GP: Talvez você seja apenas louco.
M2: Sem dúvida! Mas eu não rejeito estes ensinamentos como falsos porque sou louco. Eu sou louco porque eles são verdadeiros. GP: Éris é real?
M2: Tudo é real.
GP: Até as coisas falsas?
M2: Até as coisas falsas são verdadeiras.
GP: Como pode ser assim?
M2: Não sei, cara, não fui eu quem as fez. GP: Por que você lida com tantas negativas?
M2: Para dissolvê-las.
GP: Você desenvolverá este ponto?
M2: Não. GP: Há algum sentido essencial por trás da POÉE (Parateo-Anametamisticandade de Éris Esotérica)?
M2: Há uma História Zen sobre um estudante que pediu a seu Mestre para explicar o Budismo. A resposta do Mestre foi "três toneladas de linho".
GP: Esta é sua resposta à minha pergunta?
M2: Não, claro que não. Isto foi apenas ilustrativo. A resposta para sua pergunta é CINCO TONELADAS DE LINHO! ====================================================== Ah, quase esqueci de falar sobre o 23. O pomo da discórdia é uma maçã. Corte uma maçã ao meio. Está vendo a estrelinha de cinco pontas? São três pontas para cima e duas para baixo.
Isso dá 23. O povo discordiano tem listas intermináveis de coincidências imbecis (ou não) com esse número maledetto, que de acordo com eles prova "A Lei dos Cinco" (leia o Principia para entender a farofa). O negócio é muito divertido e vicia horrores. Eu mesmo já descobri uma porrada de ocorrências bizarras do número. É uma prática religiosa adoravelmente inútil, experimentem.
Fonte: Centro de Mídia Independente (
www.midiaindependente.org).
Link:
http://www.delinquente.blogger.com.br


PANDÆMONÆONTzimon YliasterO termo Pandæmonæon é muito utilizado por magos caóticos. A palavra em si parece haver sido cunhada por Peter Carroll, mas, como o conceito de gnose, não é uma idéia nova. A mesma idéia aparece no pensamento indiano antigo como pralaya, por exemplo. O Pandæmonæon é, na verdade, o "fim do mundo" – pelo menos em termos de qualquer coisa por nós reconhecível como uma sociedade ou civilização. Abundam as especulações sobre circunstâncias de como isso se manifestará, mas tais exercícios são um pouco tolos, dado que não há nenhuma circunstância possível dentro do próprio Pandæmonæon! Isso é compreensível, já que nosso objetivo supremo é invocar a manifestação completa do Pandæmonæon em cada nível de nossas realidades. Mas nenhuma definição clara foi oferecida até agora sobre os efeitos que sua invocação terá sobre os vários ingredientes das realidades - não apenas aquelas observadas pelos magos caóticos, mas aquelas que de fato são experimentadas por aqueles que não trabalham intencionalmente em prol da Grande Obra. É certo que existem tantas visões sobre a natureza do Pandæmonæon quanto existem magos caóticos, e é assim que deve ser. O que virá a seguir é uma visão geral sobre o efeito da chegada do Pandaemonaeon sobre as realidades sociais da humanidade.Em seu Liber Kaos, Peter Carroll define o Pandæmonæon simplesmente como a evolução da ciência para a magia, principalmente através das disciplinas científicas descendentes da atual física quântica. Carroll se abstém de fazer quaisquer projeções firmes sobre os efeitos das ramificações de tal evolução sobre a humanidade. Mais importante que a compreensão de que novas tecnologias surgirão para cobrir o vão entre o materialismo científico e a magia é a compreensão do que acontecerá com a humanidade e a sociedade quando o paradigma caos-mágico ganhar ascendência envolvendo tanto a ciência quanto a religião dentro de si. O aspecto mais importante é a transferência de informação. Atualmente, a velocidade pela qual a informação pode ser transmitida do emissor ao receptor é limitada pelo tempo, que se manifesta aqui na velocidade da luz. Isto é, entretanto, uma restrição ilusória. A informação não é matéria manifesta, e assim não cai sob o domínio das "leis universais" que parecem governar o comportamento dos meios pelo quais é transmitida. Para simplificar, precisa-se apenas imaginar o telefone. Pode parecer que a informação é transferida imediatamente, mas isso não é o caso. Há um atraso entre a partida da informação e sua recepção que é ditada pela velocidade de uma transmissão elétrica através de um fio, ou de luz através de um cabo de fibra ótica. Em outras palavras, a informação deve primeiro ser convertida em algo material e então ser movida através de outra matéria. Em última análise, não é a informação que se move; são elétrons ou fótons, que são então convertidos novamente em informação quando chegam a seu alvo. Mas a informação em si não é o elétron ou o fóton (embora estes contenham e sejam compostos de informação). A informação, como é atualmente, não pode ser medida. Ela é intangível para nós, algo que nunca pode ser experimentado diretamente. Então, o que é a informação? É aquilo que os antigos xamãs teriam batizado de mana. Não é material, nem é energia. Na falta de um cognato melhor para a idéia, ele pode ser descrito como Aethyr (éter); os quanta dispersos que se unem temporariamente para formar um fenômeno qualquer. Um Aethyr não é limitado pela velocidade da luz, não ocupa espaço algum e nem está sujeito ao tempo. É capaz de estar em mais de um lugar no mesmo momento, ou em lugar nenhum, ou quaisquer combinações de ambos. O Pandæmonæon, então, é a um nível a destruição de todas as coisas em Aethyr, ou informação. Tudo se torna aglomeração temporária mutável de acordo com a vontade, a vontade em si sendo compreendida como uma aglomeração transitória. Isto espelha exatamente o processo através do qual qualquer ato de Magia do Caos é realizado; alguém define previamente uma série de parâmetros através de várias técnicas, mas as técnicas em si não são magia. A magia se manifesta apenas quando um estado de Gnose é atingido. A Gnose é o dissipar da mente de volta ao manancial etérico através da cessação de todos os processos mentais. Qualquer número de variáveis (quanta) são então permutadas entre o oficiante mágico e o campo de potencialidades infinitas (Aethyr). A forma sob a qual se manifestarão é determinada pelos parâmetros estabelecidos pelas técnicas empregadas. Em outras palavras, as técnicas agem de forma muito semelhante à linha telefônica do exemplo anterior. Quando o Pandæmonæon tiver sido invocado, entretanto, tais passos intermediários não serão necessários. A vontade manipulará diretamente o Aethyr em configurações variadas, e nada existirá além do que foi assim configurado. A informação é transmitida, processada e configurada fora dos limites de qualquer conceito de tempo, ou seja, instantaneamente. Que efeito, então, isto terá sobre as estruturas sociais da humanidade? Deve-se primeiro compreender que qualquer estrutura social não passa de um produto de processos mentais. Estes podem, idealmente, ser modificados ao sabor daqueles que participam em dada estrutura. Indo mais longe, as estruturas sociais de qualquer tipo são tentativas de controlar a transmissão e manifestação da informação e do Aethyr. É sempre através do visor de suas estruturas sociais que o homem forma a realidade consensual. Implicitamente, então, o Pandæmonæon é o colapso de todas as estruturas sociais, já que não existirá nenhum meio através do qual transmitir a informação. Em outras palavras, todo o Aethyr é acessível instantaneamente de qualquer ponto, em quantidade infinita. As fronteiras dos construtos sociais, e também a mente individual, incharão até explodir. Todo sujeito e todo objeto serão unidos: individualidade e grupo, passado presente e futuro, todos formarão uma singularidade infinita, sem limites e em um constante estado de fluxo. Toda a separação de conceitos desaparecerá juntamente com todos os conceitos de separação. Austin Osman Spare define isto como um estado de nem/nem; E.E. Rhemus o define como uma implosão escatônica; o misticismo oriental o proclama como união com a divindade. Eles são de fato, o mesmo e o único. Assim, deve ser a meta do mago caótico remover toda e qualquer barreira à transmissão da informação. Hierarquias são derrubadas não apenas pelo simples ato, mas para apressar a chegada do Pandæmonæon através da destruição de tais barreiras. Qualquer organização, não importando seus objetivos, é uma força anti-Pandæmonæonica se intenta controlar de alguma forma o fluxo de informação. Governos, redes de comunicação, instituições religiosas e sociedades secretas se incluem nesta categoria. O verdadeiro mago caótico não buscará reter informações sobre as técnicas da magia, nem formar sociedades secretas que criem oligarquias e burocracias que são tão restritivas quanto aquelas que afirmam querer destruir. Qualquer informação deste tipo deve ser disseminada tão rápida e vastamente quanto possível; isto não apenas apressa diretamente o Pandæmonæon na medida em que aumenta um pouco mais a velocidade da transmissão, mas também assegura que outros possam encontrar e utilizar as técnicas necessárias para realizarem a Grande Obra. Qualquer outra coisa não pode ser Magia do Caos, pois fazer as coisas de outra forma é atrasar a invocação do Pandæmonæon. Traduzido por k-Ouranos 333.Fonte: Pacto Gnóstico NOX (
http://geocities.yahoo.com.br/narakamus/nox/).


SAGRADA DOIDEIRA
Simone Muniz Religião e gosto musical não se discutem, certo? Mas e quando a crença está relacionada a experiências lisérgicas para alcançar outros níveis de consciência? Desde que surgiram as raves, muita gente deixou de interpretar a saída noturna como diversão e passou a buscar o que se chama de transcendência ou espiritualidade nas festas que associam drogas a imagens da cultura mística, símbolos de deuses e rituais sagrados tribais, oferendas à natureza. Quase dez anos depois do surgimento das primeiras raves, esses elementos se mantêm, e para muita gente já ganharam cores de religião, conhecida como Tecno-Xamanismo. O nome é uma referência às batidas da música eletrônica e às experiências com plantas alucinógenas dos índios xamãs, reveladas ao mundo pelo antropólogo e escritor Carlos Castanheda, nos anos 70. Enquanto cada vez mais gente continua acreditando que o uso de drogas pode ajudar na busca da espiritualidade, djs e produtores explicaram à 2K o que realmente acontece na cultura tecno-xamã, e apontam as fragilidades óbvias dessa suposta filosofia. A expressão Tecno-Xamanismo foi cunhada no final da década de 80, pelo inglês Fraser Clark, dono do club londrino Megatripolis. O termo ajudou a formar opiniões sobre a ligação da cultura eletrônica neo-hippie com os rituais sagrados do tribalismo. Nas solenidades xamânicas, ritmos fortes e rápidos e ervas psicodélicas naturais provocavam os efeitos de transe necessários para alinhar corpo, mente e alma e conseguir uma suposta comunicação dos índios com os seus deuses. Nos tempos modernos, acrescidas do prefixo tecno, as batidas do xamanismo se tornaram eletrônicas e as drogas, em grande parte, sintéticas. Mas a filosofia tecno-xamã não é só rave e drogas. Tem uma teoria também. Parca, mas tem. Segundo seus seguidores, busca-se através dela ampliar os limites do corpo e da consciência através da observação da natureza e do ambiente que os cerca. Alguns adeptos compararam as experiências dos líderes xamanistas com as técnicas de bricolagem - o chamado faz-tudo da construção civil, a pessoa que não tem conhecimentos técnicos como um engenheiro, mas que resolve os problemas. "O tecno-xamanista não precisa saber porque algo funciona mas sim que funciona", tenta explicar Erich Schneider, um partidário britânico do Tecno-Xamanismo. No Brasil, as opiniões de quem lida - e entende - do assunto se dividem. O dj baiano Claudio Duarte de Souza, que participa do projeto de drum'n'bass Pragatecno, concorda que existe uma forte relação dos rituais indígenas com a base sonora repetitiva da música eletrônica. "Principalmente por causa do ritmo que confere o caráter hipnótico à música", analisa Claudio, que produz uma tese de mestrado sobre música eletrônica na Faculdade de Comunicação da UFBA. "A repetição dos sons fortes nas danças tribais representava a busca por um estado de transcendência coletiva. Como acontece nas raves. Uma tentativa de contactar um mundo mágico", acredita Cláudio. E, assim como os líderes espirituais controlam o ritmo dos rituais, nada mais natural que o dj's recebam o carinhoso apelido de Xamãs Digitais, como estabeleceu a tradição. "Os dj's manipulam a freqüência e a velocidade nas pistas de dança assim como os pagés nos rituais coletivos dos índios brasileiros", compara Cláudio. Imagens relacionadas às religiões estão presentes, principalmente, nas músicas que misturam mantras e timbres hipnóticos com batidas eletrônicas rápidas e bem marcadas, como no chamado psytrance ou goatrance - este último uma referência ao som das raves de Goa, na Índia, uma das mecas mundiais desse movimento. O dj de trance paulista Rica Amaral, principal organizador desde 1996 de uma das maiores raves do país, a XXXperience, diz já ter sofrido "curas espirituais incríveis" nas festas. "Cheguei a chorar de alegria dançando", conta Rica. "Quando se movimenta o corpo com ritmo e intensidade, se trabalha o alinhamento do corpo e da alma", tenta explicar Rica, que faz questão de ressaltar que seus transes nada tiveram a ver com drogas. "Sei que muita gente só consegue chegar a um estado extra-corpóreo com o uso desses ferramentas. Respeito essas pessoas, mas não é o meu caso. Drogas fazem mal", diz. Já o dj Mad Zoo, que toca trance e ambient nas raves paulistas, acredita que o conceito de trance como música espiritual está falindo. Segundo ele, é impossível haver espiritualismo em um ambiente excitado pelas batidas rápidas. "As pessoas ficam muito ansiosas por causa do ritmo. Mas, contraditoriamente, buscam a paz", justifica. A velocidade da música está a cerca de 140 batimentos por minuto. "Ninguém consegue alcançar tranqüilidade num ambiente assim. Então, as pessoas buscam no desconhecido, nas drogas, instrumentos para ficar bem", completa. Segundo ele, há uma confusão de valores. "É a mesma coisa que dizer que acredito em Deus, mas preciso do diabo", filosofa. Rica Amaral defende outro ponto de vista: "Já ouviu a música dos índios americanos? A batida tem a mesma velocidade", teoriza. E acrescenta: "Depois de duas horas dançando, você descola do chão. Isso é meditação". O dj Manoel Vani, do grupo de drum'n'bass M4J, acredita que a associação das religiões orientais com transes coletivos foi tão explorada que tornou-se oportunista. "É uma pseudo-espiritualidade. Muito mais um comércio. Algumas pessoas perceberam que música repetitiva funcionava bem, deixava o povo em estado hipnótico", explica. Apesar de ser fã do ritmo trance, Mad Zoo polemiza: "aqui no Brasil se ouve trance porque é moda". Mas ele não deixa de crer no poder da música. "A paz do lounge e do ambient se aproxima mais do espiritualismo", opina. Fonte: Revista 2k (www.02k.com.br).

PRINCIPIA CAOTICAPeter J. Carroll Na Magia do Caos, crenças não são vistas como fins em si, mas como ferramentas para criar os efeitos desejados. Entender isto completamente é encarar uma terrível liberdade na qual nada é verdadeiro e tudo é permitido, que é o mesmo que dizer que tudo é possível, que não há certezas, e que as conseqüências podem ser desastrosas. A gargalhada parece ser a única defesa contra a compreensão de que não se possui sequer um Eu real. O objetivo dos rituais do Caos é criar crenças agindo como se elas fossem verdadeiras. Nos Rituais do Caos você finge até sentir, para obter o poder que uma crença pode prover. Em seguida, se fores sensato, você rirá delas e buscará as crenças necessárias para qualquer coisa que queira fazer depois, à medida em que é movido pelo Caos. Assim, o Caoísmo proclama a morte e o renascimento dos deuses. Nossa criatividade subconsciente e nossos poderes parapsicológicos são mais que adequados para criar ou destruir qualquer deus ou Eu ou demônio ou qualquer outra entidade espiritual na qual possamos acreditar ou desacreditar, pelo menos, para nós mesmos e, às vezes, também para os outros. Os resultados freqüentemente aterradores alcançados pela criação de deuses através do ato de comportar-se ritualisticamente como se eles existissem não deverá conduzir o mago Caótico no abismo de atribuir realidade definitiva a qualquer coisa. Este é o engano transcendentalista, que leva a um estreitamento do espectro do Eu. O verdadeiro terror reside no leque de coisas que podemos descobrir que somos capazes de fazer, mesmo se tivermos que temporariamente acreditar que os efeitos se devem a algo externo para que possamos criá-los. Os deuses estão mortos. Longa vida aos deuses. A Magia apela aos que têm muito orgulho e uma imaginação fértil, somadas a uma forte suspeita de que ambas, a realidade e a condição humana, possuem as características de um tipo de jogo. O jogo possui final aberto, e joga a si mesmo por diversão. Os jogadores podem criar suas próprias regras até certo ponto, e, se desejado, trapacear usando parapsicologia. O tipo de magia apresentado aqui, consiste em uma série de técnicas que atuam como extensões extremas das estratégias normais que são possíveis dentro do jogo. Um mago é alguém que vendeu sua alma pela chance de participar mais inteiramente da realidade. Apenas quando nada é verdadeiro e a idéia de um Eu verdadeiro é abandonada, tudo se torna permitido. Existe alguma exatidão no mito de Fausto, mas ele falhou ao levá-lo à sua conclusão lógica. Precisa-se apenas da aceitação de uma simples crença para que alguém se torne um mago. Esta é a metacrença de que a crença é uma ferramenta para obter efeitos. Este efeito é geralmente muito mais fácil de observar nos outros do que em nós mesmos. É comumente muito fácil ver como outras pessoas e, até mesmo outras culturas, são mais ou menos capazes, de acordo com as crenças que possuem. Crenças tendem a levar a atividades que tendem a reconfirmá-las, num círculo normalmente chamado de virtuoso, ao invés de vicioso, mesmo quando os resultados não são agradáveis. O primeiro estágio de ver através do jogo pode ser uma iluminação chocante, que leva a um cinismo tedioso, ou ao Budismo. O segundo estágio de real aplicação do insight em si mesmo pode destruir a ilusão da alma e criar um mago. A compreensão de que crença é uma ferramenta, ao invés de um fim em si, tem imensas conseqüências se aceita por completo. Dentro dos limites impostos pela possibilidades físicas, e estes limites são muito mais vastos e maleáveis do que a maioria das pessoas imagina, pode-se fazer reais quaisquer crenças escolhidas, incluindo crenças contraditórias. O mago não é aquele que busca por uma identidade particular e limitada, mas aquele que deseja a meta-identidade que o torna capaz de ser qualquer coisa. Assim, seja bem-vindo ao Kali Yuga do pandaemonaeon, onde nada é verdadeiro e tudo é permissível. Nestes dias de pós-absolutismo, é melhor construir sobre areia movediça que em pedra, que lhe confundirá no dia em que vier a rachar. Os filósofos têm se tornado não mais do que proprietários de sarcasmos úteis, pois foi revelado o segredo de que não há segredo no universo. Tudo é Caos, e a evolução não está indo a nenhum lugar em particular. É o puro acaso que comanda o universo, e assim, e apenas assim, a vida é boa. Nascemos acidentalmente em um mundo aleatório, onde apenas causas aparentes levam a efeitos aparentes, e muito pouco é pré-determinado, graças ao Caos. Como tudo é arbitrário e acidental, talvez estas palavras sejam muito simplórias e pejorativas; ao invés disso seria melhor dizer que a vida, o universo e todo o resto são espontaneamente criativos e mágicos. Deleitando-se com a realidade estocástica, podemos nos regalar exclusivamente com as definições mágicas da existência. As estradas do excesso podem ainda levar ao palácio de sabedoria e muitas coisas indeterminadas podem acontecer no caminho do equilíbrio termodinâmico. É inútil buscar chão sólido onde pisar. A solidez é uma ilusão, como o pé que a pisa, e o Eu que pensa possuí-los é a mais transparente de todas as ilusões. As pesadas embarcações da fé estão furadas e afundando juntamente com todos os botes salva-vidas e suas jangadas engenhosas. Então você vai fazer compras no supermercado de crenças ou no supermercado de sensações e permite que suas preferências de consumo definam seu eu verdadeiro? Ou você, em um estilo corajoso e alegre, roubaria ambos apenas por diversão? Pois a crença é uma ferramenta para obter qualquer coisa que se considere importante ou prazerosa, e a sensação não tem nenhum outro propósito além da sensação. Assim, ajude-se a obtê-las sem pagar o preço. Sacrifique a verdade pela liberdade, em cada chance que tiver. O maior divertimento, liberdade e realização estão em não ser você mesmo. Há pouco mérito em simplesmente ser quem quer que você seja por um obra congênita acidental e circunstancial. Inferno é a condição de não ter alternativas. Rejeite então as obscenidades da uniformidade planejada, da ordem e do propósito. Vire-se e encare as ondas das marés do Caos, das quais os filósofos têm fugido apavorados por milênios. Pule para dentro e saia surfando em sua crista, exibindo-se em meio à estranheza sem limites e o mistério em todas as coisas, rejeitando falsas certezas. Graças ao Caos isso nunca terminará. Crie, destrua, divirta-se, IO CAOS! Traduzido por Lucifer 149 e k-Ouranos 333
[1] Mesmo Crowley, outro revolucionário, baseou muito de seu sistema na magia cerimonial clássica da Golden Dawn - entre outras fontes
[2] Que se considerava um continuador do trabalho de Aleister Crowley no campo da expansão da consciência humana.
[3] Você enxergou algum?
[4] Qualquer relação com "cada homem e cada mulher é uma estrela" e "lutai como irmãos" é uma brincadeira de mau gosto de seus neurônios.
[5] Representada por Leary, Wilson, Hillman, Grof e diversos outros.
[6] Vide a "Missa de Panielo", criada pelo Fr. Leghba Valys 418, Oo NOX.
[7] Realizado pelo Fr. Abraxas 223, Oo NOX